Benjamin Teixeira
pelo espírito Lidiane (*).

Há alguns anos, um paciente pediu-me tempo largo, em respeito à complexidade da questão que iria tratar. Em vista disto, como psicoterapeuta, treinada que já era a não ter pressa na condução dos processos de atendidos, ainda menos me preocupei em catalisar as crises e buscas de meu cliente.

Havia-se decidido ele a especular que nascera para ter mais de uma mulher e que, assim, em vista dos princípios de liberdade e de modernidade nas relações entre os sexos, que deveriam imperar entre pessoas “civilizadas” – “filosofava” –, poderia se dar ao luxo de se render às suas fantasias sexuais. Tentei, com o tempo, mostrar-lhe que se tratava, sua “filosofia”, de uma manifestação refratada de narcisismo, dissimulada com elaborados termos cultos – uma racionalização, portanto –, mas ele, então, descartava meu ponto de vista, como fazia com tudo que destoasse de seu universo de caprichos pessoais.

O fato é que acabou esgotando a paciência da primeira esposa… e da segunda; e, depois, da primeira amante, da segunda… e da terceira (!), acabando seus dias com uma mulher trinta anos mais nova, com quem só mantinha vínculo, porque lhe pagava as contas, enquanto ela se entregava a uma faina frenética de promiscuidade com homens de sua idade, bem mais jovens que meu cliente.

Confesso, com o coração doído, que, secretamente, cheguei a me felicitar, na condição de mulher, vingada pela classe, ao contemplar aquele machista inveterado, que fez uso de conquistas da modernidade para machucar corações, ser, por fim, punido pela Vida. Mas esta minha fraqueza oculta – um rápido momento de deslize feminino – não passou, realmente, de um breve bruxuleio. Meu pobre cliente havia arrasado com sua própria vida, em todos os departamentos, em nome de um capricho de valor no mínimo questionável. Os filhos lhe perderam o respeito; a empresa de que era proprietário acabou por abrir falência, com os gastos exorbitantes que teve que realizar, para manter a última mulher, sem contar as pensões alimentícias exigidas em justiça pelas duas primeiras esposas e o golpe na sua conta bancária pessoal que lhe deu de presente a terceira amante, no momento do desenlace final de seu romance novelístico de gosto duvidoso.

E eu fiquei a me interrogar, com o ocorrido a este que foi o meu mais demorado cliente – tratou-se comigo enquanto estive encarnada, durante vinte anos (continuei a lhe acompanhar o caso, mais tarde, já desencarnada) –, quantas pessoas não fazem o mesmo com suas existências, sem o menor respeito ou cuidado consigo mesmas, além, é óbvio, da falta de tato e consideração com os outros.

Arrependo-me, hoje, de não ter sido mais assertiva e apresentado opiniões mais claras de minha parte, mas a ética profissional, por aqueles dias, não dava muito espaço a métodos mais “invasivos”, e tive que contemplar a progressiva ruína do meu atendido, ano a ano, como se observasse um rato a morrer, em laboratório, vitimado por antigo e conhecido veneno, com antídoto de fácil acesso, mas proibido de ser usado. Só que não se tratava de um rato: era meu paciente! E, deste modo, o que nos primeiros anos foi difícil (atender aquele machão desavergonhado, à moda antiga) tornou-se, progressivamente, doloroso para mim, até se converter numa tortura que não teria como descrever, ante a impotência de intervir num drama humano angustiante e trágico. Apenas na condição de desencarnada, com a perspectiva da eternidade e a orientação de respeitáveis mentores espirituais, tive condições de encarar a situação com tranqüilidade. Nos últimos anos do atendimento que lhe ofereci encarnada, só não pedi que não retornasse ao meu consultório, porque julgava que não poderia mais aconselhá-lo como amiga, fora dele (pela longa relação terapêutica – mais uma vez a tola ética profissional em vigor por aqueles dias), como também porque lhe queria propiciar, por outro lado, a chance de que, nas poucas provocações que me permitia fazer em sua fala, “mordesse a isca” de minhas sutilíssimas proposições e rompesse com aquele terrível padrão autodestrutivo.

Quantas pessoas vivem à caça ensandecida de miragens que julgam metas admiráveis! Quantos desperdiçam existências inteiras, no afã de realizarem intentos autodestrutivos. Gostaria de deixar aqui registrado, assim, meu pobre alerta, para que cada um verifique o que pode, em proporções menores (ou talvez nem tão menores…), estar acontecendo em sua vida, a fim de que utilize construtivamente a lição do drama vicioso de meu antigo atendido, atualmente em lamentável situação na nossa dimensão de vida, carpindo horríveis padecimentos, conseqüentes das companhias espirituais perturbadoras com que se afinou, em sua longa jornada de sexomania, na última reencarnação.

Tentei falar com ele, inúmeras vezes, nesta sua nova e deplorável circunstância de espírito sofredor em regiões infernais do plano astral, mas não me conseguiu ouvir, preso a angustiosos padrões de culpa e medo, fugindo das imagens de tudo que deixou para trás, de mais valioso em sua vida, em troca de reles e insatisfatórias paixões dos sentidos…

(*) Lidiane é pseudônimo utilizado por grande professora de psicologia carioca, desencarnada na década de 70 do século passado, na casa ainda de 40 anos.

(Nota do Médium)


Veja na “Notícia da Semana”, clicando ao lado esquerdo de seu monitor, a matéria “Êxtase Coletivo”, assinada pela jornalista sergipana Thaïs Bezerra.

(Nota do Departamento de Divulgação)

Fonte: http://www.saltoquantico.com.br