Competição, inveja, manipulação e perfídia no seio do lar e na vida social, quando a verdadeira conversão espiritual

(Benjamin Teixeira de Aguiar) – Querida Eugênia, é muito comum que antigos afetos deem as costas e se voltem contra pessoas que ingressam em atividades religiosas ou espirituais, de quaisquer correntes, acusando-as de fanáticas ou enlouquecidas. Devotos(as) sinceros(as) e até gurus respeitáveis são assim interpretados(as), frequentemente. A ruptura entre adeptos(as) de linhas religiofilosóficas e a esmagadora maioria (se não a totalidade) de seus(suas) parentes e amigos(as), incluindo eventuais cônjuges, é uma provação universal. Alguns(umas) insistem em tentar reverter esse quadro, no afã inglório de partilhar sua fé e felicidade. Teria algo a dizer sobre isso?

(Eugênia-Aspásia) – A despeito de realmente haver casos evidentes de fanatismo e desequilíbrio, facilmente detectáveis, existem (e não são raros) processos autênticos de ascese espiritual, que inevitavelmente desencadeiam incompatibilidades inconciliáveis, de natureza energética, vibratória, consciencial, gerando conflitos graduais e cumulativos entre aquele(a) que “despertou” para um patamar mais alto de lucidez e seus entes queridos.

Prioridades de vida, interesses, gostos e mesmo o teor de conversações são substancialmente modificados, quando se vivencia uma legítima conversão espiritual, que pode acontecer repentina ou paulatinamente. A metanoia constitui uma transformação estrutural de personalidade e foco, e não meramente uma mudança circunstancial ou emocional, como supõem observadores(as) menos perspicazes e/ou responsáveis.

Verifica-se, portanto, uma quebra de afinidades muito profunda entre o(a) “convertido(a)” e seu círculo anterior de relacionamentos. E, lamentavelmente, isso tende a se intensificar com o tempo: à medida que avança em sua busca espiritual, mais o(a) discípulo(a) da sabedoria se distancia de indivíduos que não lhe acompanham o ritmo de desenvolvimento mais acelerado, de maneira que novos rompimentos, traumáticos ou suaves, se sucedem em seu jornadear.

Esse fenômeno psicológico é automático, porque decorre da repulsão que naturalmente se dá entre frequências psíquicas discrepantes. Dessarte, redundarão em fracasso quaisquer esforços que, embora bem-intencionados(as), se oponham a essa realidade, assim como seria inútil alguém tentar, aos socos, alterar a estação de um aparelho radiofônico, depois que outrem lhe girou o dial. Só se pode lograr êxito na tentativa de compartilhar a própria fé, não importando se a iniciativa é inteiramente honesta e amorosa, quando há receptividade de valores, sentimentos e ideias naqueles(as) que são chamados(as) a um nível mais elevado de consciência.

(BTA) – É assustador notar, a propósito, a biografia de Chico Xavier, um retrato emblemático, a meu ver, dessa experiência tão dolorosa quanto rotineira, que, por sinal, se manifesta dramaticamente na trajetória de vultos mais célebres. Chico morreu distanciado de toda a parentela biológica, apesar de haver sustentado as irmãs, até a vida adulta, e ajudado a criar inúmeros(as) sobrinhos(as).

(EA) – Alhures, já falamos sobre isso, noutros termos. Criaturas que nascem e crescem no mesmo berço de um(a) orientador(a) espiritual de multidões enfrentam enorme dificuldade para lhe acatarem a “superioridade moral”. Não lhe reconhecendo a face mais nobre e genuína, exatamente a que lhe representa o diferencial evolutivo e o(a) qualifica como mais velho(a) espiritualmente, veem no(a) familiar consanguíneo(a) com quem conviveram na infância apenas um ser humano comum, esquecidas de que os(as) santos(as) não eram anjos, mas sim seres humanos realizando projetos sobre-humanos.

Se há vantagens monetárias e sociais implicadas no vínculo parental – por exemplo, com expoentes da área política ou econômica –, os problemas relacionais que despontam são, em grande medida, logo encobertos pelos demais membros da família, sob a capa do interesse financeiro mal dissimulado.

Na seara religiosa ou espiritual, todavia, esses ganhos materiais ficam menos perceptíveis ou simplesmente desaparecem. Ademais, em considerando que tais lideranças mais amadurecidas imprimem (ou deveriam imprimir) uma expressão de maior autenticidade e assertividade (em regra, malvistas) em suas relações interpessoais, geralmente os(as) parentes biológicos(as) se sentem golpeados(as) em seu orgulho e, ato contínuo, desenvolvem mecanismos de racionalização, mancomunando-se para sustentarem reciprocamente suas teses defensivas e então depreciarem as figuras desses(as) irmãos(ãs) adiantados(as) em evolução, que não têm a menor preocupação em conquistar aprovação externa nem em manipular as boas intenções de quem quer que seja.

Lembremo-nos de que Jesus foi a Voz da Verdade, por excelência, para a civilização terrena. Não há verdades absolutas, no âmbito hominal de existência, mas é óbvio que missionários(as) com a função de conduzir massas para Deus apresentam um coeficiente, digamos assim, muito maior de verdade em seu discurso, e isso melindra o emocional de expressiva parcela dos(as) educandos(as) que lhes recebem os esclarecimentos benfazejos, principalmente quando ministrados num tom mais agudo de transparência.

Luz intensa fere as retinas acostumadas à escuridão. Temperamentos imaturos e egocentrados, que não querem se empenhar no trabalho de automelhoria e de adaptação ao grau de luminescência a que são expostos, normalmente rechaçam o socorro do Alto, escolhendo a posição acomodatícia de julgar excessiva a irradiação luminosa.

(BTA) – Seres que estão na vanguarda da evolução planetária, os “marginais da faixa de cima da média evolutiva” (remetendo-me às suas palavras, Eugênia), habitual e inelutavelmente chocam o vulgo com sua postura catalisadora do progresso, sendo, por isso, não raro tratados como criminosos vulgares e equiparados aos que se retêm na retaguarda, “os marginais da banda de baixo”. Jesus Cristo foi o Exemplo máximo dessa injustiça recorrente na história. E Seus(Suas) porta-vozes, da mesma sorte, quase sempre passam por arrogantes, prepotentes e até indecentes.

(EA) – Esperável, ou não haveria o desnível evolucional a que aludimos. Orgulhosos(as) presumem arrogante qualquer um(a) que aponte críticas a sua conduta pretensiosa.

Por outro lado, quando um(a) mentor(a) espiritual encarnado(a) começa a ser malquisto(a) no reduto doméstico, um(a) ou mais parentes que antes estavam ofuscados(as) pelo seu carisma peculiar, imediatamente se aproveitam da situação para exercer poder sobre a família, unindo-se aos(às) querelantes queixosos(as), acolhendo-lhes os impulsos de autovitimização e alimentando-lhes a loucura, com o fito de potencializar a discórdia e mais seguramente manobrá-los(as) a seu bel-prazer.

Apesar de vivamente autoritárias, essas pessoas surpreendentemente se mostram solícitas e de pronto concordam com os desabafos que lhes chegam, a respeito do(a) ora condenável, escondendo, traiçoeira ou (na melhor das hipóteses) inconscientemente, sua real motivação: rivalizar a ascendência intelecto-moral que o(a) líder nato(a) usufruía no núcleo familiar, ascendência essa que invejavam e não tinham como suplantar, antes da crise.

(BTA) – Soube de um caso interessante, Eugênia, que bem retrata o que você acabou de descrever. Um sujeito que mantinha distância de seus(suas) parentes, privando-se até mesmo de contatos virtuais ou por telefone, foi tachado de controlador por familiares que não aceitaram sua discordância acerca de alguns pontos de vista e objetivos de vida que adotaram…

(EA) – Eles(as) próprios(as) são controladores(as) e projetam esse seu traço em terceiros, ou talvez estejam sendo induzidos(as) a assim pensar por gente ávida em subjugá-los(as). Observe-se, cautelosamente, a origem das acusações e rapidamente se detectarão agentes com um interesse particular em fazer proliferar essa opinião. A imaturidade psicológica confunde discordância com ataque ou ofensa pessoais – que são atitudes abissalmente distintas.

(BTA) – Como acompanhei o imbróglio, Eugênia, acho importante destacar, para ser justo com os dois lados, que o indivíduo atualmente atacado cometeu alguns excessos, a meu ver, exagerando nas proporções de sua fala, já que “perdeu a cabeça” ao ouvir os insultos mais absurdos.

(EA) – Conheço o episódio. Essa sua ressalva em nada muda o panorama que apresentei. Excessos emocionais são típicos das interações familiares – isso é notório. Decerto, todos(as) devem contemporizar em circunstâncias críticas – também não é novidade. Muitos(as) alegam que algo verbalizado em determinado momento, de forma mais veemente, foi o que os(as) levou a se afastarem do(a) “ofensor(a)”, mas uma análise isenta sobre o ocorrido comumente revela que os(as) postulantes ocultam – amiúde até de si próprios(as) – seus verdadeiros motivos, porquanto é extremamente difícil facear certas culpas mais arraigadas, que costumam reiterar-se século sobre século.

(BTA) – Inveja, rivalidade, competição, mesquinharia, raiva pelo sucesso do(a) outro(a)…

(EA) – Patentes.

(BTA) – E que alguns(umas), mui sinceramente, não admitem em si…

(EA) – A competição entre irmãos(ãs), exaustivamente comprovada por pesquisadores(as) do comportamento humano, é autoevidente para qualquer espectador(a) ligeiramente lúcido(a) e atento(a) à dinâmica fraternal. Essa rivalidade apenas varia em seu percentual de manifestação, de grupo a grupo, de pessoa a pessoa, mostrando-se mais acirrada, sobremaneira, entre irmãos(ãs) do mesmo sexo ou com a mesma orientação sexual.

Negar essa obviedade é mentir deliberadamente, quando não denota uma falha ainda mais grave e não muito incomum: a mendacidade, o distúrbio psicológico de mentir para si mesmo(a) com tanta eficácia e por tanto tempo, que se perde a noção da própria intenção de mentir.

De ordinário, ninguém desce ao desequilíbrio de zonas infernais de consciência declarando-se um(a) pecador(a) ou acreditando ter perpetrado o mal. Os(as) incautos(as) que se rendem às forças da desagregação, em graus variados, sentem-se vítimas e não algozes – salvo raras exceções. Eis por que as regiões purgatoriais, dentro ou fora da dimensão material de vida, estão abarrotadas de sofredores(as).

Quando o interesse pessoal e o ego estão em jogo, os seres humanos frequentemente enlouquecem, desperdiçando suas mais preciosas oportunidades existenciais. E, às vezes, precisam aguardar, por séculos, uma outra ocasião que lhes possibilite o ressarcimento por seus desvios e quedas clamorosos.

(BTA) – Que grave, Eugênia!… E essas almas podem se beneficiar com um texto como este?

(EA) – Provavelmente não se reconhecerão como vilãs e tornarão ao expediente da racionalização. O desculpismo, qual um vício mental, entra em cena automaticamente, engendrando justificativas que lhes parecem plausíveis. Quebrar esses padrões de percepção, que se tornam filtros invisíveis à própria mente, é um cometimento demasiado árduo e laborioso.

Mesmo quando há impressionantes prodígios1 confirmando a procedência superior dos argumentos canalizados pela liderança então rejeitada, os(as) “amigos(as)” e familiares destrambelhados(as) encontram sempre meios de perverter a interpretação dos fatos, de molde a continuarem enxergando-a como desvirtuada.

O desespero desses(as) acusadores(as) contumazes impede-os(as) de se flagrarem em erro. No fundo, a perspectiva de assumirem a própria culpa, como também de encararem seus medos ocultos, deficiências, preguiça e covardia, soa-lhes tão atordoante, que preferem criar fantasias bem urdidas sobre o entrevero, atribuindo ao(à) parente mais evoluído(a) a parte equivocada na pendência.

(BTA) – Todos(as) que tomam conhecimento da situação, não estando envolvidos(as) na contenda, notam claramente a “alienação mental” que acometeu a família desse indivíduo. E, trágica quão ironicamente, é exatamente isso que dele pensam os(as) familiares que o hostilizam.

(EA) – Confiemos à força do tempo a solução dessas desavenças corriqueiras, conquanto sempre se afigurem únicas para os(as) que as experimentam. A implacabilidade do tempo demonstrará onde reside o bom senso e onde impera a injustiça.

Jesus nos ofertou um excelente referencial para conjunturas mais intrincadas ou melindrosas, psicológica e moralmente: “Conhece-se a árvore pelos frutos”2. A personalidade a quem você se reportou não lhe parece mais feliz, realizada, produtiva e criativa? E o que acontece com os(as) parentes que se creem vitimados(as) pela incompreensão? Poder-se-iam dizer felizes e em paz, nos diversos campos de suas vidas, sobretudo no espiritual? Ou estariam pressentindo, no imo de seus corações, um sinistro zumbido que jaz abafado pela fúria em pretenderem estar certos(as) a qualquer custo?

Sim, eles(as) já entreveem, aqui ou ali, esse chamado à razão e à justiça… mas o solapam sumariamente, não lhe permitindo aflorar à luz da consciência. Têm o direito de tomar tal vereda reprovável, entretanto. Neste universo de respeito inviolável ao livre-arbítrio humano, a Divina Providência autoriza que Suas criaturas se iludam, até certo ponto, para que, agravando as consequências de suas faltas, aprofundem a leitura sobre si mesmas e possam se redescobrir. Como há pouco delineamos, seus egos caprichosos muito lhes comprometem, de início, a capacidade de perceber e dimensionar apropriadamente os próprios erros, embaçando-lhes a intuição de estarem fora de rota.

(BTA) – Isso pode levar séculos…

(EA) – Sim. Costumeiramente.

(BTA) – Mais algo a dizer?

(EA) – Estou em paz. Devoto-me aos(às) alunos(as) que permanecem comigo. Esse é um paradigma a ser vivido pelos(as) lídimos(as) cristãos(ãs). O Próprio Cristo asseverou que Sua Mãe e Seus(Suas) irmãos(ãs) eram aqueles(as) que cumpriam a Vontade do Ser Supremo.3

Tenho muitos espíritos que passei a ver como filhos(as), desde que aportei na Terra, há alguns milênios.4 Guardo-os(as) no coração – dois deles, inclusive, antes mesmo de emigrarmos para este orbe. Um, em particular, deveras ativo na parceria de trabalho que prestamos ao bem comum, propicia-me, por mercê de Nossa Mãe Maior, alcançar aluviões de consciências, a fim de alertá-las sobre riscos sutis da estrada evolutiva, libertá-las de suas angústias sistemáticas e resgatá-las da beira do abismo em que ameaçam se precipitar, nessa sociedade pejada de relatividades cínicas e complexidades perigosas.

Como integro à minha família espiritual novos filhos e filhas constantemente, não me lamento pelos(as) que “perco” – nunca foram meus(minhas). Nossos(as) filhos(as) são filhos(as) de Deus, e não nossos(as) – Khalil Gibran foi sumamente inspirado em celebrizar esse conceito, no plano físico do globo.

Ao contrário do que alguns(umas) de nossos(as) protegidos(as) infelizmente cogitam, nós que compomos a comunidade dos guias espirituais da civilização terrestre não partilhamos dos distúrbios emocionais desta humanidade. Muitas vezes, toldados(as) pela generalizada tendência à autocomiseração, esperam que choremos suas mágoas e caprichos feridos – choram sozinhos(as). Estamos a serviço da felicidade de todos(as) e não da insensatez egoica de quem se entrega a processos parasitários e perversos de encapsulamento no orgulho pessoal.

Ainda que amemos desmedidamente, podemos (e devemos) consagrar nosso amor a outras almas de boa índole e boa vontade, que de fato desejem aproveitar-nos as exortações elucidativas, a seu próprio benefício, até que, num futuro próximo ou distante, as que se desencaminharam voltem a nos considerar mais diretamente as proposições.

Líderes espirituais que, insulados(as) ou não em veículos de carne, se acumpliciam com complexos de vítima de caracteres acrimoniosos e improdutivos, ou mesmo contrários às obras do bem, não passam de pseudossábios(as) que macabramente acariciam egos cristalizados na condição de “pobres injustiçados”, para mais e mais hipnotizá-los em sua trama de manipulação, à guisa da aranha que fisga o inseto no visco de sua teia, de modo a lentamente devorá-lo com sua sanha famélica.

(BTA) – No futuro, quando essas pessoas voltarem a receber seu amor e assistência, talvez seja bem mais difícil…

(EA) – Necessariamente sê-lo-á. É provável que, em posteriores reencarnações, não venham a ter ciência de meu amor por elas e sequer de minha existência.

(BTA) – Lamentável…

(EA) – Nosso conselho de professores(as) da Espiritualidade Amiga está muito satisfeito com os resultados altamente construtivos e compensatórios, quando levamos em conta a coletividade e não casos isolados de indivíduos que se agrilhoam a suas escolhas ilusórias de “felicidade”.

(BTA) – Obrigado, Eugênia.

(EA) – Agradeçamos, tão somente, a Nossa Mãe Todo-Amor, Maria Cristo, e a Seu Filho Excelso, Nosso Senhor Jesus, que nos concedem, em Nome de Deus, o ensejo de intercambiarmos ideias e sentimentos, para melhor aproveitamento de nossas vidas, sejam elas desfrutadas no domínio de matéria densa ou além dele, durante o período intermissivo5, que possui ciclos semelhantes aos de uma reencarnação, no tocante a cumprimento de tarefas, aprendizados específicos e amadurecimento da personalidade, em vista dos interesses últimos do espírito imortal que todos(as) somos, como viajores(as) da eternidade.

Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
em diálogo com Eugênia-Aspásia (Espírito)
27 de julho de 2009

1. Como os que ocorriam em torno do santo e gênio mediúnico Chico Xavier.
(Nota do médium)

2. Mateus 7:16, Lucas 6:44.
(Nota da equipe editorial)

3. Mateus 12:48-50, Marcos 3:33-35, Lucas 8:21.
(Nota da equipe editorial)

4. A orientadora espiritual é originária do sistema planetário de Capela, estrela da constelação do Cocheiro. Vide Últimos 45 séculos da história evolutiva do Espírito Eugênia-Aspásia (diálogo mediúnico).
(Nota da equipe editorial)

5. Período entre encarnações.
(Nota da equipe editorial)