Benjamin Teixeira
pelo espírito
Eugênia.

Há um certo tipo curioso de personalidade, muito comum na Terra. Sente-se magoado, quando as coisas não correm conforme seus interesses. Gosta de receber assistência, amizade, instruções e conselhos de graça, mas não se sente devedor de absolutamente nada, nem mesmo, freqüentemente, de gratidão ou respeito por quem lhe ofereceu o tesouro de seu saber e de sua boa-vontade, de sua dedicação e assistência. Passa anos usufruindo do trabalho e do devotamento de benfeitores desinteressados e, ao notar uma falha humana, corre espavorido, sentindo-se terrivelmente injustiçado.

Os que partilham dessa natureza curiosa possuem, amiúde, portentosa ficha evolutiva (no sentido intelectual), mas não admitem que sejam primários onde são: nos sentimentos. Assim, quando deixam claro o que lhes vai à mente, principalmente para aqueles de quem mais recebem ou receberam, deitam fel e ingratidão, sem piedade, justamente aos ouvidos que mereceriam silêncio, se não fosse possível um mísero agradecimento. Olham com reserva tudo e todos que têm que “pagar” ou dar algo em troca, para intercambiar algum valor. E, no que tange a relações gratuitas, aquelas mesmas que indicariam uma inequívoca dívida de gratidão, até ficam felizes, por receberem o que buscam, enquanto suas pretensões são atendidas, mas não admitem o menor desconforto ou frustração às suas expectativas caprichosas, infantis e, em muitos sentidos, cruéis.

É desta forma que, por exemplo, um filho pode se dar por chocado, quando percebe que sua mãe está com problemas e não está tão disponível, “como sempre esteve”, e, sem notar o absurdo de suas impressões, sente-se traído pela mãe “desnaturada”, que não quer dar continuidade a seu martirológio de sacrifício pessoal em função dos filhos. Mães, nesse sistema de crenças medonhamente egoísticas, devem se “arrebentar” pelo bem de seus filhos. E, em gratidão por serem quase anjos ou agirem como tal, mesmo sem serem (humanas, carentes e frágeis que sãos as mulheres-mães da Terra), dá-se, às vezes, um cartãozinho de dia das mães, com uns dizerezinhos impressos, escrito por um autor anônimo, que, por sinal, ao fazê-lo, não pensava na mãe que se presenteia, a pobre de Cristo por quem tanto se deve, mas no arquétipo da mãe pura, boa e santa, que dá o sangue e a vida por seus filhos, sem nada receber em compensação. E ai da mãe humana que não se equipara a esse estereótipo torturante de santidade forçada! É tratada como monstra-louca…

Com um guru espiritual ou alguém que seja visto como representante de Deus, algo semelhante acontece. Não pode ser portador de desejos naturais, carências, fraquezas humanas ou vontades pessoais, de nenhum nível, ou logo é visto à conta de charlatão, de negligente, de irresponsável ou incoerente com os postulados que abraça. Assim, quando estes denodados da causa divina apresentam seus aspectos humanos, eles que constroem obras de amor, por sobre oceanos de lágrimas que o vulgo desconhece, por confiança pedindo ajuda para saciar sua sede de afeto e compreensão, são exatamente no seu ponto fraco atacados, magoados e muita vezes deixados a sangrar sem remissão. E, então, esses abnegados do projeto de espiritualização da Terra seguem, alguns à beira da loucura, dando desmedidamente de si a todos, recebendo quase nada de poucos, ainda sob o olhar de reserva, desdém ou mesmo escárnio daqueles que “não entendem” como eles têm a audácia de não serem santos, de pedirem alguma coisa para si, como se a perfeição e a pureza absolutas constituíssem uma obrigação de seres humanos que já se devotam além do normal a servir ao Criador e a seus irmãos em humanidade.

Esses estranhos psicotipos vampirescos e semi-loucos sentem-se vítimas, por não serem incensados quando recebem, como se receber orientação, auxílio e afeto fosse um favor que prestassem a mães, sejam biológicas ou psicológicas, de famílias ou de coletividades. Assim, o filho se sente prestando um favor à mãe, visitando-a no fim de semana, de tal modo que se mostra ofendido se ela não estiver bem humorada e dadivosa, naquele dia em que deveria, em tese, estar recebendo mais do que dando, do filho adulto que lhe deve a vida biológica e que lhe consumiu anos de preocupações e de desgaste físico e psicológico. Do mesmo modo, aquele que vai assistir a um culto ministrado gratuitamente, amiúde supõe-se prestigiando o preletor altruísta, que parou sua vida para fazer um trabalho que beneficia muitos, sem receber remuneração ou compensações outras, de modo que sai esbravejando do ofício religioso, quando algo não sai de acordo com o seus gostos pessoais, opiniões ou inclinações egóicas, como se o trabalho, que lhe foi oferecido de graça, devesse se ajustar como uma luva a suas idiossincrasias, ideologias, opiniões e desejos particulares.

De onde vem tanto delírio? – perguntar-se-ia você. E nós lhe respondemos: de um mecanismo de defesa psicológico de mentes imaturas, no desenvolvimento espiritual. Como não são propriamente criminosas e já têm senso de dever e responsabilidade, quando muito recebem e devem, precisam dramaticamente, desmerecer as virtudes e os méritos de quem deu ou dá tanto a elas, e distorcer completamente a natureza de sua atitude injusta, ingrata e mesmo perversa, para uma pseudo-postura de indignação justa, porque não suportariam se ver tão más, mesquinhas, egoístas e orgulhosas, como de fato são. Assim, vêem-no como um demônio, à custa de parte de sua lucidez e sanidade mental, distorcendo eventos e dados, para não verem a si mesmos como seres malévolos e medíocres.

Fique atento para se precatar dessas pessoas, tanto quanto não se equiparar a elas. São vampiros insaciáveis, que podem aturdi-lo e fazê-lo distrair-se da tarefa fundamental que o trouxe à reencarnação, pois que querem atenções e cuidados especiais para si, fazendo toda ordem de manipulação, da culpa ao complexo de inferioridade, a fim de submeter os que querem, ao talante de suas vontades egóicas. Tiram tudo de todos e acham sempre justo e mesmo natural todo sacrifício que os outros façam por seus interesses pessoais. Mas não se demovem, um milímetro que seja, de sua linha de desejos e interesses pessoais, para beneficiar quem quer que seja, a não ser quando esperam receber algo em troca, geralmente de valor que reputa superior ao que dá.

Sirva e trate essas pessoas com distinção fraterna, mas mantenha-se longe de sua intimidade, porque não só nunca estarão satisfeitas com o que lhes der, como estranharão quando, esgotado de tanto dar, despenque, exangüe, e peça socorro. Eles simplesmente se retirarão do ambiente, relegando-o a cruel abandono, “chocados”, amiúde ferindo-o, por você não ter continuado a dar, quando já não tinha mais nada a dar… São eles drenos vivos da energia vital alheia, verdadeiros buracos negros humanos, devorando a tudo e todos que passa no circuito de sua influência. A vaidade, o narcisismo, a imaturidade psicológica e espiritual e o capricho egocêntrico não lhes permite enxergar o absurdo de sua conduta e somente mais tarde, muito mais tarde, chorarão amargamente, por tudo que fizeram você sofrer, por não ser… um anjo, quando o mérito do que faz é maior, justamente por não sê-lo.

Deixe-os cuidarem de si próprios, porque precisam desenvolver fontes de suprimento em si mesmos, antes que o impeçam de realizar seu trabalho, por muito se acharem dignos, nobres e especiais, deixando um rastro de tristeza e devastação por onde passam… feras empavonadas de civilização, bestas disfarçadas de vítimas sofredoras, ou, na linguagem de Jesus: “lobos em peles de cordeiro”.

(Texto recebido em 7 de junho de 2004.)