Benjamin Teixeira
pelo espírito
Roberto (*).


– Oi, “gatcchiiienha”, como vai? – soltou o rapaz, entre dentes, com um cínico olhar sedutor, num chiadíssimo e patético “carioquês” de morro, recostado, com empáfia, em seu reluzente conversível vermelho, “estalando” de novo.

A moça bonita é vaidosa, narcisista e caprichosa, acostumada a ser adulada pela própria beleza e fascínio, seduzida, continuamente, para a idéia de que pode ficar com o melhor partido da praça, pela facilidade que tem para atrair a atenção de quase todo elemento do sexo oposto. Poderia ser amável e doce como a vizinha do rapaz, por quem ele se interessara mais jovem, por ser estudiosa e dedicada à família (mas feiosinha e sem graça, com pouco talento para provocar os rapazes). Todavia, para a moça bonita ser simpática e generosa como a vizinha “feinha”, tendo sido bajulada desde cedo, seria necessário um nível de maturidade psicológica e grandeza moral muito superior à média de nosso orbe, o que não era o caso daquela mulher “arrasa-quarteirão”.

O rapaz, porém, havia “subido” muito de “vida”, desfilava com carro novo importado e era brindado, todo mês, com um salário gordo na conta bancária. E, podendo, desistiu da vizinha pouco voluptuosa, para casar com a “mulher para homem rico”, daquelas que “só poucos podem comprar”.

O fato é que, poucos meses depois, sem grandes afinidades e quase nenhum amor, uma conta bancária se casou com um corpo bonito, e foram, como não era para deixar de ser, muito infelizes, numa relação de fachada para o mundo, dissimulação para eles próprios e desconfiança dentro de si mesmos. Ele, porque sabia que ela continuava atraente para outros homens de sucesso, que lhe poderiam ser superiores em poder e riqueza, e levarem-na consigo, a qualquer hora. Ela, porque sabia que ele continuava cobiçado por outras beldades casadoiras, na caça a homens afortunados, a todo momento assediado por jovens lindas, tão vazias como ela própria. Dez anos depois, estavam separados.

Enquanto isto, a moça não tão bonita da vizinhança, após a tristeza mortal da ruptura com o antigo namoradinho do bairro, contraiu núpcias com um colega de faculdade, decente e trabalhador. Além de se amarem profundamente, afinados em seus gostos e valores (e não arrumados em suas conveniências, como o primeiro casal), organizaram-se com primor, foram felizes, tiveram filhos; de tal modo que, quando o matrimônio do outro casal terminou, não só se encontravam de vento em popa no seu consórcio vitorioso, como acumulavam sucesso e até fortuna proporcional à da primeira dupla. Estavam ditosos no casamento, na vida profissional e pessoal (com a bênção dos rebentos da relação). A moça feiosa na adolescência fez cirurgia plástica e aprendeu a se vestir com elegância, chamando agora tanto ou mais atenção que a beldade decadente, cheia de trejeitos nervosos e ares afetados; e o marido, inicialmente pobre, mas inteligente e esforçado, adquiriu destaque na empresa, subindo a cargo de diretor em poucos anos… com um salário superior ao do rapaz rico da vizinhança…

O casal dos desejados-badalados, após o trauma da separação e as brigas vergonhosas por bens, ante estranhos horrorizados, em sessões de divórcio litigioso, saíram do malogro conjugal sem filhos (pois que nunca julgaram apropriado tê-los, no clima de desconfiança em que viviam), e partiam vazios, angustiados e pessimistas, culpando-se um ao outro, pelo próprio infortúnio, preparados para atrair e iniciar outra desgraça afetiva, em novos casamentos de arranjo de interesses, por não terem assumido a responsabilidade pelo próprio padrão de egoísmo e mesquinharia: a verdadeira geratriz de sua infelicidade…

É… Como este mundo é cruel… com os cruéis!…

(Texto recebido em 12 de maio de 2007. Revisão de Delano Mothé.)

(*) Roberto é irreverente, sarcástico e direto em suas colocações, e, de antemão, é bom sempre avisar que é impróprio (risos) para pessoas pouco tolerantes a assertivas “despreocupadas” em ser políticas ou muito psicológicas. Quem se mantém atento ao conteúdo de suas idéias, porém, nota que o autor espiritual apenas apela para um método mais enfático de persuasão, conforme a lógica rasteira do mundo físico, para tratar, com brilho, de questões e princípios eternos do mundo espiritual.
(Nota do Médium.)