por Benjamin Teixeira.

Florianópolis, primeiro semestre de 1977. Minha família se mudara para a capital catarinense, e por lá permanecera, pelo transcurso de um ano e meio (dezembro de 1975 a julho de 1977), para que meu pai fizesse seu mestrado em “Engenharia da Produção”. Tinha 6 anos de idade. Era o menor da turma – e o mais novo. Estava cursando o 2º ano primário do “Colégio Sagrado Coração de Jesus”, e meus coleguinhas tinham entre 8 e 9 anos, em sua esmagadora maioria. Uma diferença de dois a três anos, na infância, como se sabe, é um abismo, em todos os sentidos. Era precoce o bastante para acompanhá-los nos estudos, mas em nada mais. Só que, por eles, não era visto como o “super-dotado” que supuseram flagrar em mim os diretores do colégio. Era o “bobão”, motivo de chacota e de ataques gerais. Não tinha coordenação motora, nem capacidade de atenção que me equiparasse aos meus colegas. Vivia disperso em sala de aula. Quase não acompanhava o que era ensinado pela professora. Havia a construção de um edifício exatamente ao lado da janela de minha sala, e eu passava longo tempo observando o trabalho dos operários. Não adiantava que se me chamasse a atenção. Eu tornava a me dispersar. Era algo simplesmente irresistível para mim. A construção era um ímã poderoso a atrair meus olhos. Era fascinado por engenharia civil, por aqueles dias. O problema do déficit de atenção (ou talvez de mero interesse pelo que era discorrido em sala de aula), todavia, acompanhar-me-ia durante toda a vida estudantil, até o terceiro grau. Sobre isto, uma situação do segundo ano do segundo grau, em ’87 bem retratava meu desgosto com as aulas. Um embate entre mim e um professor de matemática. Eu insistindo em ler Sartre (“O Ser e o Nada” – que quase me enlouqueceu, na altura dos meus 16 anos), e ele em que eu fechasse o livro e assistisse à aula. Teimei em dizer que se ele quisesse, poderia ir para a secretaria do colégio, sendo expulso da sala, mas não pararia de ler o livro. Recusava-me a aprender o que não me parecia seria útil no futuro. Coitados de meus professores (principalmente de química e física)…

Partida de futebol. Era sobre isto que desejava partilhar com vocês. Fazia parte de uma aula de educação física. O professor traçou as regras. Mas eu era peça dificílima a submeter-me a regras (acho que continuo assim – risos). Nunca conseguia pegar a bola (Nossa!, tinha que pegá-la com os pés: isto era quase impossível para mim). Os colegas “enormes” de oito e nove anos, é claro, roubavam-me toda chance de participar do jogo. Então, resolvi começar a brincar. Fazia um zumbido pelo nariz, imitando uma buzina de automóvel, e restringia-me a correr atrás dos coleguinhas sempre um pouco atrás, com dificuldade de alcançá-los. Uma chatice só – para todos, inclusive para o professor, que, como a “tia” dos estudos “intelectuais”, ralhou inutilmente comigo, inúmeras vezes. Um teimoso incorrigível.

Castigo. Sentado na arquibancada, sozinho, com minha pasta. Uma sensação mortal de solidão se esbateu sobre mim. Queria tanto conversar com alguém… Ninguém queria nem gostava de conversar comigo. Era o excluído dos excluídos em tudo. Tinha que fazer alguma coisa. Olhei em torno novamente. Sozinho. Sozinho… A dor moral era indescritível e crescente. Minhas irmãs eram meninas e mais novas. Meus colegas muito mais velhos. Os professores só me chamavam a atenção. Foi quando a “voz” me apareceu pela primeira vez nesta atual vida física. “Ei! Ei!” Procurei em torno d’onde podia provir aquela voz. E acabei por achar que a fala vinha da minha pasta. Não me lembro com exatidão do que foi dito, mas recordo-me vagamente de algo como: “Vamos conversar. Podemos ser amigos. Eu posso ser o seu amigo”. O fato é que passei maravilhosos minutos de conversação agradável e compensadora, e minha tristeza foi convertida em magnífica alegria: a alegria de ter um amigo – alguém que gostava de mim, que não achava que eu só dizia ou falava bobagens, e que se dava ao trabalho de querer entabular uma conversa comigo.

“Amigo Imaginário” – rezam, sobre esta categoria de “distúrbio infantil”, os manuais clássicos de psicologia. E, sem dúvida, a carência afetiva e a busca inconsciente de compensações para o isolamento podem gerar a “chave de sintonia” para a conexão com inteligências alojadas em outras dimensões de vida. Sem dúvida, assim como capacidades intelectuais e emocionais novas são desenvolvidas à base do estímulo imperioso da necessidade, também a mediunidade, normalmente “aberta” à custa de medonhas crises existenciais. Não há nada de estranho nisto. Mas ninguém costuma atribuir uma excepcional capacidade verbal de um grande orador a um “distúrbio infantil”. Preconceito em relação às questões e fenômenos espirituais, mais uma vez. A realidade, porém, não deixa de ser o que é, porque haja, homens e mulheres que se dizem “de Ciência” portadores de idéias pré-concebidas – o mais absurdo dos contra-senso para quem se pretenda representante da Ciência.

O episódio da “pasta falante” é minha memória mais antiga de um contato mediúnico nesta encarnação. Como não entendia que uma entidade pudesse existir sem corpo, imaginei que a voz só podia estar partindo de minha pasta – a única “coisa” perto de mim. Mais tarde, porém, quando tive uma forte experiência de escuta psíquica de “vozes”, aos 10 anos de idade, o ego-racional (já bem mais desenvolvido) conseguiu dar uma explicação mais plausível, para o garoto que procurava ter uma perspectiva realista e racional da vida: estava falando com minha “imaginação”. “Nossa! Que imaginação fértil eu tenho! – dizia de mim para comigo – “Estou realmente ouvindo uma voz!”. Só que a voz tinha personalidade, discordava de mim, dava-me conselhos… Sim… fragmentação do psiquismo… conheço esta teoria também. Quem vive a experiência, todavia, sabe que toda teoria “psicológica e psiquiátrica” vem por terra, ante uma realidade pujante e auto-evidente. Mesmo porque “doença mental” indica perda de qualidade cognitiva e do poder de avaliação e entendimento da realidade e era exatamente o contrário que se dava comigo, netas ocasiões, passando a falar, agir e pensar num nível de compreensão do mundo muito acima do que me era possível então, num estado normal de consciência.

Para dar uma idéia disto, recordo-me de quando, em 1978, ainda antes de completar 8 anos, aproximei-me de uma adolescente chorosa e dizer-lhe que ela procurasse entender que o amor, quando não era verdadeiro, assemelhava-se a uma chama de palito de fósforos, que se esvaía rapidamente, e que, portanto, ela buscasse relacionamentos (chamas) fundamentadas em bases que resistissem às rajadas de vento da vida. “Menino, quem lhe disse isto?” Claro que havia aprendido a não dizer d’onde provinha o pensamento. Mesmo porque, à época, era comum só sentir a estranha sensação de minha mente se expandir e captar pensamentos que não eram meus, juntamente ao impulso imperioso de dizer algo a alguém, em dado momento.

Minha mãe, dotada de mediunidade ostensiva, como eu (além de duas de minhas três irmãs – há inequívocos elementos genéticos nesta aptidão), relata-me eventos mediúnicos comigo mais antigos, de minha infância tenra. Como já afirmei aqui, tenho memórias remotas, até de antes dos meus dois anos de idade, mas são pontuais, de modo que muita coisa me é revelado pelos mais velhos que conviveram comigo na primeira infância, não me recordando diretamente. Conta-me ela que, em mais de um episódio, ouviu-me conversar com um interlocutor vindo “do nada”, correndo desesperada em minha direção, com receio de algum mal-feitor haver adentrado nossa casa, com intenção de me raptar (mamãe sempre teve o pressentimento de que me perderia – diz ela que me perdeu para o mundo, com minha enorme família espiritual do Projeto Salto Quântico – risos). E, quando chegava ao lugar onde estava, encontrava-me palestrando com visitantes espirituais que ela mesma detectava, com sua psicovidência, para logo em seguida desaparecerem, um deles sendo identificado posteriormente como o antigo dono da casa que meus pais adquiriram em 1972, em que residimos até abril de 1989. Numa destas ocasiões, então, segundo ela me descreve, teria eu dito, mais ou menos nestes termos:

– Olhe, mamãe, este é o meu amigo de que lhe falei. ‘Tá vendo agora?

Sim, ele houvera aparecido para ela e desaparecido logo em seguida, o suficiente para minha mamãe intuir que se tratava de “uma boa presença”, e se tranqüilizar, na condição que tinha na época de uma católica sincrética que se diz “vidente”, bem típica no Brasil.

Cuidado com as falas de seus filhos pequenos. Há nelas elementos imaginários, sem dúvida, tanto quanto extratos importantes de memória de outras vidas, bem como de conteúdos de contato mediúnico com as entidades que se afinam com seu pimpolho, que lhe podem trazer importantíssimas informações que lhe subsidiem no processo de educação deles mesmos. Tratar a criança, nestas ocasiões especialíssimas, como se ela estivesse “inventando” ou, pior ainda, ralhar com elas, com a acusação de que estariam “mentindo” é terrivelmente destrutivo, não só para sua auto-estima, como mesmo para sua a saúde mental.

Agradeço a Deus, pela mãe sensível e compreensiva que me acompanhou os eventos mediúnicos da infância, com naturalidade. Que todas as mães brasileiras sejam assim, para que um dia, no mundo materialista ocidental como um todo, também as mães, num futuro longínquo (talvez nem tão distante) também encarem com a mesma tranqüilidade tais fenômenos, sobretudo porque, na infância (principalmente até os 7 anos) a criança não está completamente “conectada” a seu corpo físico. Algumas pessoas, que denominamos “médiuns ostensivos”, preservam ou espocam mais tarde tais potenciais, como no meu caso, que, durante toda a infância (bem depois dos 7 anos), ouvia passos e vozes perto de mim, mormente à noite (para meu completo terror). Outras, simplesmente terão esta faculdade embotada, para que se concentrem no desenvolvimento de outras habilidades, conforme a programática evolutiva para suas atuais existências no mundo material.

E as vozes me trouxeram até aqui, e ai de mim e dos inúmeros casos de suicídio (direto e indireto) que foram evitados, entre os milhares de socorridos (talvez já na altura dos milhões) pelo Projeto Salto Quântico, não fossem estas abençoadas “vozes”, que, com o tempo, mostraram rosto e compleição “física”, tornando escorreitos e progressivamente mais profundos seus conselhos sábios e boas intuições, que enriquecem este site com pérolas que nos alimentam a alma, a começar por mim mesmo.

Abençoada a mediunidade que nos salva da loucura, da maldade e da crueza deste mundo. Não fora ela e creio que já teria morrido de desgosto profundo ou perdido completamente a rota de minha felicidade e paz. Creio que talvez você possa dizer algo parecido, nem que seja das palavras de nossa doce e sábia Eugênia, a mãe-mentora espiritual do Projeto Salto Quântico, de quem todos somos tão devedores!…

(Texto redigido em 27 de setembro de 2005.)