Benjamin Teixeira de Aguiar
pelo Espírito Eugênia-Aspásia.

“Dai de graça o que de graça recebestes.”

Benjamin Teixeira de Aguiar – Prezada amiga, o que pode nos dizer sobre trabalhar, em tempo integral, com atividades espirituais e/ou mediúnicas, a começar desta sentença, muito conhecida no Brasil: “Dai de graça o que de graça recebeis”?

Orientação de Jesus Cristo e as razões de Paulo de Tarso.

Espírito Eugênia-Aspásia – Quanto à famigerada máxima, princípio corretíssimo, em seus fundamentos mais profundos. O espírito de gratuidade deve permear todas as ações humanas. No mesmo passo em que Jesus propõe o “dai de graça o que de graça recebestes”, conclui o raciocínio elucidando que “o trabalhador é digno de seu sustento” (ou de seu salário, conforme algumas traduções) e ordena que Seus discípulos nada levem consigo, ao se dedicarem às tarefas apostolares – e em nenhum momento solicita-lhes qualquer outra ocupação paralela. Foi Paulo de Tarso quem introduziu a ideia de manter outra atividade, de subsistência, para impor respeito ante a comunidade cristã primordial, (1) pela enorme reserva que ele despertava, em virtude de sua condição de ex-perseguidor do Movimento nascente, além de (2) ter sido um Apóstolo autoproclamado (embora legítimo), isto é, não foi colocado por Jesus na posição em que se apresentou, enquanto o Mestre esteve encarnado, mas também (3), e não menos polêmico, ao tempo do “Apóstolo dos Gentios”, por sequer haver conhecido o Messias fisicamente! Os demais Apóstolos do Cristo, desde que convidados Pessoalmente, pelo Mestre dos Mestres, a segui-l’O, abandonaram suas profissões, como são famosíssimos os episódios da “conversão” de Pedro, Tiago e João, que eram pescadores, e de Mateus (Levi), que ocupava o ofício de cobrador de impostos.

Machismo e homofobia em Paulo de Tarso.

Todo homem ou mulher é falho(a), inobstante possa cumprir papéis extraordinários em sua época, a despeito da falibilidade humana. Nas históricas epístolas de Paulo à cristandade dos primeiros tempos, de permeio a magníficas proposições de valor intemporal, encontramos afirmações que hoje são severamente perigosas, por lastrearem atitudes discriminatórias, contra mulheres e homossexuais, o que não se encontra, é claro, nas Falas de Jesus.

O médium e o cirurgião.

Há quem diga que não se pode cobrar pelo empenho em desdobrar um bom trabalho mediúnico, sob a alegação de que o esforço seria exclusivamente dos Espíritos. Os que pensam dessa forma desconhecem, primeiramente, o que seja uma tarefa mediúnica, em termos de exaustão psicofísica para o medianeiro, e, segundo, não têm noção da delicadeza e complexidade em seus preparativos e premissas para um ótimo desempenho, muitas vezes comparáveis aos atinentes a uma operação médica. Por outro lado, um cirurgião (utilizando-nos da mesma metáfora) ou qualquer outro profissional devem a Deus a inteligência que têm, a saúde que portam para exercer seu ofício, bem como as condições materiais e psicológicas de que dispuseram para estudar. E, por terem recebido tudo isso da Divina Providência, seria cabível julgar indevido que cobrem salário ou pagamento pela prestação de seus serviços?

A missão sacrificial de Chico Xavier.

Indubitavelmente, houve abusos em relação ao dinheiro, assim como no que concerne ao poder, às Religiões, à Ciência, à Política, à Educação, em suma: onde quer que o ser humano tenha posto suas imperfeitas mãos. Por isso, para que se superassem preconceitos atinentes às iniciativas de comunicação com o Mundo Espiritual, foi necessário que surgisse um ministério gloriosamente sacrificial, como o de Francisco Cândido Xavier, que não ficou sequer com direitos autorais de sua obra mediúnica. Dessarte, à força do não se ter como difamá-lo, impôs-se respeito à sacralidade das interações psíquicas entre vivos e mortos na matéria, qual ocorreu a Paulo e seu apostolado, nos primórdios do Cristianismo.

A santidade de Paulo de Tarso e de Chico Xavier… e os outros Luminares.

Há santidade óbvia na figura do Apóstolo que Jesus chamou a Seu serviço, às portas de Damasco, como no encantador e puro médium de Pedro Leopoldo. Mas e o que dizer dos demais Apóstolos, estabelecidos pelo Próprio Cristo, e de médiuns extraordinários de outras ordens cristãs, que dedicaram suas vidas integralmente às tarefas espirituais, como São João Bosco, Teresa d’Ávila, Catarina Labouré, Teresa de Calcutá ou Irmã Dulce? Seriam menos nobres, ou teriam ficado comprometidas as suas faculdades de inspiração e ação em Nome do Plano Maior, pelo fato de não haverem tido outra fonte de sobrevivência material que não a própria atividade religiosa? E o que pensar sobre os expoentes das grandes tradições do Oriente, cujos sábios e iluminados de variados perfis psicológicos e aptidões mediúnicas se retiraram do cotidiano humano, para se devotarem a transcendentes buscas pelo esclarecimento profundo?

O que disseram espíritos de escol, por médiuns dignos, desde Kardec.

O argumento de que não se pode discutir o assunto, porque os espíritos sérios, por meio de médiuns dignos, do tempo de Kardec para cá, sustentaram a obrigatoriedade de não se vincular dinheiro ao exercício da mediunidade, é tão radical, tolo e altamente equivocado, quanto propugnar que, por São Paulo ser um grande enviado do Reino de Deus, devamos seguir sua postulação de que mulheres não falem nas igrejas, ou de que estariam elas obrigadas a obedecer a seus maridos, como o corpo à cabeça. Erro idêntico seria nos sentirmos compelidos, tão só por Kardec ter sido um embaixador de Altiplanos Espirituais, a acatar-lhe a ideia de que as raças humanas constituiriam “classes evolutivas”. Tão nocivo quanto isso seria, por reconhecer em Chico Xavier um emissário autêntico do Mundo Maior, estabelecermos como correta a assertiva, encontrável em seus textos mediúnicos, de que mulheres não devam ocupar misteres de mais de um turno, para não comprometerem sua função maternal, ou a de que o divórcio, afora situações de perigo de homicídio ou suicídio, consistiria num desvio de rota ou, na melhor das hipóteses, “adiamento de carma”. As mensagens espirituais sofrem os filtros de época e lugar, da cultura dominante e do tônus mental do médium. As falhas de tradução mediúnica acontecem entre os melhores representantes das Alturas, excetuando-se Jesus.

Ser professor não era profissão.

Para ilustrarmos nossos raciocínios, a função de professor quase inexistia, até o século XVI, sendo praticada apenas por diletantismo de alguns heroicos homens e mulheres pertencentes à aristocracia ou ao clero. Quando se aceitou universalmente o princípio de que se poderia viver para ensinar, em dedicação total, as escolas se propagaram pela Europa, fazendo eclodir a Revolução Científica, seguida pelo Iluminismo e a Revolução Industrial, modificando, para melhor e para sempre, a civilização terrena, espalhando sobre o planeta não só os benefícios do sanitarismo e da cultura, mas os ideais democráticos e o conceito e a defesa das liberdades individuais, incluindo as de culto religioso.

Extremos no uso e no desuso do dinheiro.

Castrar a viabilização, no mundo físico, de Obras do Domínio Celeste, retardando a disseminação da Voz da Verdade sobre a Terra, configura um crime gravíssimo, de que se dará contas, na dimensão espiritual de Vida. Recordemo-nos de que o medicamento ao enfermo, o alimento ao faminto e o esclarecimento ao desorientado precisam de recursos materiais para serem providenciados. Sem dúvida, entendemos que o levantamento de impérios econômicos e o acúmulo de fortuna, através de atividade religiosa, não seriam metas recomendáveis. Mas é igualmente condenável a postura daquele(a) que cerceia o que pode e deve fazer e ofertar ao mundo, escorando-se na bizarra doutrina de que a pureza de suas motivações seria conspurcada pelo manuseio da ferramenta sagrada do dinheiro. Em última análise, recursos monetários representam títulos ao portador, que favorecem a vida, tanto quanto podem introduzir a morte, pela qualidade do uso que se lhes faça, ou pelo DESUSO a que sejam relegados.

O que é ser “interesseiro”? Hipocrisias e complexidades no conceito.

Quando se fala de devermos ter cuidado com “médiuns interessados”, precisamos nos interrogar sobre a que gênero de interesse está-se aludindo, porquanto interesses todos os temos, inclusive os altruísticos e humanitários. Para clarear o sentido da indagação, devemos nos perguntar qual o interesse central, o objetivo último da pessoa, em uma ação espiritual, nas atividades profissionais dignas ou nas relações familiares honestas. Eis por que começamos este ensaio dizendo da necessidade de compreender e de fato aplicar, em termos de profundidade, a máxima do “dai de graça o que de graça recebestes”. Nesse campo de reflexões, há muita hipocrisia e ignorância, e a mancomunação destes dois medonhos males (hipocrisia e ignorância) leva a toda ordem de fundamentalismo e fanatismo religiosos, como eventos históricos e contemporâneos retratam, tragicamente.

Interesse financeiro no casamento, na profissão, na formação acadêmica.

Constituiria uma perversão, decerto, alguém definir casamento ou carreira por questões financeiras. Mas isso ocorre com uma frequência assustadora, podendo-se dizer, com segurança, que raras criaturas não consideram o fator econômico como importante, no momento de decidir sua profissão, formação acadêmica, ou mesmo no instante de escolher parceiro(a) ao matrimônio. E, ainda quando parece haver exceções à regra, frequentemente vemos indivíduos menos amadurecidos ou capacitados, que optam por alternativas ditas menos glamourosas e mais fáceis, não por vocação, mas por não terem competência ou não desejarem se esforçar para galgar posições sociais de maior destaque. Embora não se possa generalizar, obviamente, é muito comum que pessoas vistas como desapegadas ou sem grandes ambições sejam, em verdade, menos dotadas de disposição ao trabalho ou de inteligência para trabalhar com competência.

O interesse por controlar pessoas, de entes queridos a coletividades.

Dinheiro não é a única moeda de troca para a deturpação de propósitos de qualquer ação honesta e justa. Voltando ao tema do exercício de canalização entre as duas esferas de Vida, incorre em grave desvirtuamento da função sagrada da mediunidade quem a utilize, por exemplo, para manipular, consciente ou inconscientemente, entes queridos, qual uma “dedicada” mãe que incorpore o “mentor espiritual” no seio do lar, para exercer maior poder sobre os filhos. Há gente carente e neurótica, desesperada por atrair simpatia ou parecer superior, que se traveste de humildade e desinteresse, para cativar a admiração de quantos lhe não enxerguem as malandragens sutis ou crassas. Isso quando não assistimos ao espetáculo deplorável de empreendimentos “caritativos” ou “filantrópicos” se desdobrarem, com despudor, por dirigentes de organizações criminosas (como narcotraficantes em favelas) ou políticos corruptos (entre eleitores desfavorecidos), a fim de cooptarem, para si, o apoio das comunidades que beneficiam… com a pior espécie de interesse de poder sobre pessoas, instituições e até sobre o maior instrumental de controle: o Estado!…

Nos EUA e na Inglaterra…

Que se foque o bom senso e o equilíbrio de posições equidistantes entre os extremos. Dilatando o quadro que estudamos, adite-se que, na Inglaterra e nos EUA, existem médiuns profissionais e até associações que regulam a atividade, fornecendo credenciais para sua prática judiciosa. Não pretendemos propor que se apliquem ao Brasil, com cultura diversa, diretrizes equivalentes. Mas é bastante ilustrativo que, para os anglo-saxões, seja natural suspeitar-se, não de alguém que cobre por serviços prestados, mas sim daquele que o faz gratuitamente, seja porque este último, para eles, parece ocultar suas reais motivações de algum ganho pessoal, seja porque compreendem que se pode viver com muita decência de propósitos, dentro do exercício de uma profissão remunerada… A questão do relativismo cultural nos dá perspectiva de como os extremos são gravemente perigosos.

As oscilações das faculdades mediúnicas.

Como fazer intercâmbio entre o domínio dos desencarnados e encarnados é labor que depende de certos estados especiais de consciência, imponderáveis, imprevisíveis e, por isso mesmo, pouco passíveis de administração consciente, além de estar evidentemente sujeita à ação de Assistentes espirituais, não se pode garantir que o intercurso sempre funcionará a contento. Contudo, de tal conjuntura não se deve inferir que o médium não possa dedicar a própria existência ao nobre escopo de ser porta-voz entre as duas dimensões de existência. Em vez disso, descobre-se, nessas peculiaridades melindrosas do exercício mediúnico, que há mais mérito na tarefa, na medida em que maior coragem se exige de quem se candidate a semelhante ministério. Por analogia, acontece algo similar com profissionais d’outros segmentos, como o artístico, que se veem obrigados a lidar com o “branco criativo” que os oprime, episodicamente. Da mesma sorte, um psicoterapeuta ou um professor conscienciosos podem se declarar impedidos de dar cabo de sua agenda de compromissos com clientes ou alunos, em certas circunstâncias, quando se sentem severamente comprometidos em suas condições íntimas, para atuar com isenção e responsabilidade, nas complexas demandas de seus deveres.

Como os fariseus fizeram a Jesus.

Alertemo-nos! A Vontade de Deus amiúde está na contramão das convenções, porque dispõe o progresso de indivíduos e povos. Concentremo-nos na intenção de fazer o bem, na decência dentro da prática de toda profissão ou ocupação voluntária (se for o caso), para que, sob o pretexto de sermos muito ciosos de tradições espirituais, não ajamos como os fariseus e saduceus, ao tempo de Jesus, que se julgaram aptos a condená-l’O à morte, considerando-se profundamente embasados para tanto, nas sagradas escrituras que ainda hoje compõem o Antigo Testamento da Bíblia. Há os que façam isso, atualmente, com interpretações anacrônicas desses mesmos textos e de excertos do Novo Testamento, ou de artigos mediúnicos modernos, esquecidos de que o Próprio Cristo, no transcurso de Seu Messianato Divinal, quando esteve encarnado na Terra, propagando a Voz da Verdade, curando os enfermos, esclarecendo os residentes da dimensão extrafísica de vida, os “daimons” (do grego: espíritos), entre outras atividades (todas de caráter espiritual, por excelência), não Se dedicou a nenhuma outra ocupação de subsistência material, asseverando ainda, categoricamente, que Seus discípulos deveriam seguir Seus passos, como dissemos no início deste breve estudo.

A apocalíptica condenação de Quem pode julgar: Jesus.

Por sinal, a respeito das recomendações do Cristo a Seus discípulos, de não levarem nada consigo, para as perigosas viagens de pregação e cura de enfermos, está lavrada também a orientação de que escolhessem, onde chegassem, uma casa onde se albergar, provisoriamente, e que comessem do que lá lhes ofertassem, rogando paz para aquele lar e aquela cidade. Em contrapartida, na eventualidade de ninguém lhes aceitar a visita, em certas localidades, advertiu Jesus que as comunidades lá alojadas seriam julgadas no “Dia do Juízo” (avaliadas pelos Prepostos da Divindade e pelas Leis do Carma), com mais severidade que as indisciplinadas e caóticas Sodoma e Gomorra, as bíblicas cidades pulverizadas pelo “Fogo do Céu”.

Não importando o que aconteça ou a quem contrariemos…

Respeitamos e veneramos as obras ciclópicas de Paulo de Tarso, Allan Kardec e Chico Xavier, mesmo no que eles disseram ou escreveram que não mais se aplique às necessidades dos dias que correm, cônscios de que assim agiram, nesses aspectos menos atualizados de seus trabalhos, em função de imperativos inequívocos de educação do público alvo de suas mensagens respectivas. No entanto, para desvelarmos o que seja mais apropriado para o futuro mais feliz e próspero de indivíduos ou agrupamentos humanos, orientando-nos, com algum grau de acerto, nas difusas e sibilinas questões eternas de nossas almas (como deve ser praxe de cristãos conscientes), desculpem-nos os que com isso se ofenderem e se exaltarem por inspiração de suas doutrinas, pois que seremos (não importando o que aconteça, pensem ou falem) consistentes e perseverantes nesta filosofia de vida: Jesus será sempre nosso Modelo e Guia, Referência e Ideal!…

(Texto psicografado em 7 de setembro de 2014.)