Benjamin Teixeira de Aguiar – Estimada Eugênia, você nos poderia dizer alguma coisa sobre a epidemia do ebola?

Espírito Eugênia-Aspásia – 40 mil pessoas morrem de gripe por ano, apenas nos EUA. Nem de longe isso é motivo para manchetes de noticiários ou reportagens que fisguem a atenção de milhões, e, pelo descaso em relação ao perigo real envolvido no tema, massas enormes vão a óbito prematuramente, por descurarem de buscar a vacina anual contra as novas cepas viróticas. Já um único caso de falecimento por ebola, em território norte-americano, provocou todo o rebuliço a que assistimos. Sim, o sentimento de impotência ante o alto grau de mortalidade – no atual surto, em torno de 60% – pode promover isso. Entretanto, importa abarcar ângulos mais amplos, de etiologia psicológica, que cheguem a raízes de problemas mais profundos. Vejamos.

Os milhares de desencarnes por ebola na África não causaram espécie. Quando a ameaça chega à Europa e aos EUA, no entanto, providências internacionais de vulto começaram a ser tomadas. Urge sairmos do paradigma ultrapassado dos interesses de grupo, tribais ou mesmo nacionais. O egoísmo primitivo da selva não condiz com a complexidade do mundo moderno, interconectado, globalizado. A paranoia geral bem demonstra um pouco do pânico subjacente, relacionado à necessidade flagrante de se abandonar o modelo anterior de pensar e sentir.

Todos agora são compelidos a entender que uma enfermidade no meio da savana africana ou o sofrimento de uma jovem oprimida sexualmente na China ou no Oriente Médio, por exemplo, não mais representem quase ficções, curiosas e bizarras, a serem vistas na televisão ou noutros meios de comunicação. É doloroso partir para a perspectiva da interdependência planetária…

Por que nunca se trabalhou, significativamente, por uma vacina ou tratamentos eficazes contra moléstia tão letal, desde sua descoberta, há quatro décadas? “Por que salvar aquela gente pobre e negra na África?…” – blasfemariam alguns. Essa cruel ordem de preconceito e indiferença deve-nos causar horror. Somente em reconhecendo sua existência e atuação, pode o mal ser erradicado.

BTA – Você parece introduzir o outro tema, o “Estado Islâmico”…

EEA – Jovens carentes e discriminados em suas sociedades: nas ocidentais, por não se julgarem aptos a se enquadrar no modelo de sucesso da economia de mercado e da cultura do êxito material; em países de origem muçulmana, por não terem recursos sequer para contrair núpcias… O desespero velado costuma se converter em agressividade assassino-suicida, eventualmente genocida, não importando o gênero do discurso que pretenda justificar a perpetração de atentados criminosos. É fácil manipular jovens frustrados. Governos e líderes, povos e indivíduos de gênio precisam acelerar seus esforços por resolver a questão grave e progressivamente mais ampla, inclusive nos países ditos desenvolvidos, relacionada ao contingente gigantesco de pessoas que ficam à margem do sistema socioeconômico e que não mais se contentam com a passividade da exclusão pura e simples.

BTA – Deseja aditar algo mais sobre esses assuntos?

EEA – Verifiquemos, individual e coletivamente (sobremaneira os dirigentes de agrupamentos humanos, de quaisquer dimensões), em que medida podemos estar incursos nessas perigosas ilusões da “separatividade”, já completamente derrogadas pelos avanços na Física do início do século passado (sejam os da Mecânica Quântica ou os da Astrofísica, de feição einsteiniana), não obstante muitos teimarem em abraçá-las ainda hoje, recusando-se a adotar posturas combativas da exclusão e promotoras da inclusão social, humana, cultural.

As ciências biológicas, por sua vez, em particular a dos ecossistemas, têm-nos alertado para o crasso equívoco de não considerarmos, séria e efetivamente, o paradigma da interrelação universal entre seres e processos. E o que está em jogo é a própria sobrevivência da espécie humana sobre a superfície do planeta…

Chegou a hora de agirmos com mais inteligência e realismo, despertando da hipnose primária de supor que espiritualidade, humanismo e respeito a diferenças constituam agenda para políticos, acadêmicos ou artistas de vanguarda. Trata-se de uma urgência inadiável que toca diretamente, reiteramos, à sobrevivência de cada um(a) e de todos na Terra.

New Milford, Connecticut, EUA.
22 de outubro de 2014.