Benjamin Teixeira
pelo espírito
Eugênia.

Relacionamentos genuínos implicam crises episódicas de ajuste e conhecimento recíproco em maior nível de profundidade, porque não só a própria mente é um mistério a si, como a psique do outro ainda mais, sem contar os processos inevitáveis de falha de comunicação, mudança íntima e experiências singulares por cada um vivenciadas que não necessariamente são partilhadas pelo outro, gerando motivos válidos de “descoincidência” de pontos de vista ou de valores que precisam ser aclarados, sob a luz do diálogo fraterno, mas franco, caso se pretenda manter o relacionamento num nível se sincera cumplicidade num nível íntimo. Relacionamentos sem brigas ou discussões, é relacionamento inconsistente, superficial ou mentiroso (ou uma conjunção de tudo isso), em que um ou dois se anulam, em função de uma calma relacional doentia, que prenuncia a paralisação da alma e o assassínio da sinceridade.

Diante disso, não suponha que discordância seja sinal de distonia entre você e seu ente querido. Melhor que as divergências façam-se visíveis, no nível de consciência, que reprimidas, no campo da sombra psicológica, a assombrarem a harmonia da relação.

Não se preocupe em ser sempre “bonzinho”. Este princípio é particularmente válido se estiver num relacionamento íntimo. Diga o que pensa ser importante ou essencial, com jeito, com amor, mas invariavelmente com sinceridade, a fim de que não deixe pendências graves ficarem ocultas na senda de seu destino, como uma bomba relógio que, se não desativada em tempo, pode fazer em pedaços o que foi longamente construído no transcurso, às vezes, de toda uma vida.

Hoje, pode você ter discutido com o amigo ou o cônjuge, o irmão ou o filho, o pai ou aquele camarada para toda obra. Mas, se o fez para refletir, claramente, para o interlocutor estimado, a verdade de seu coração, para que ele, de sua parte, possa refletir a dele para você, fez algo imprescindível e vital para seu vínculo afetivo, embora doloroso, desconfortável ou apenas incômodo.

Por fim, atente-se para, na mesma medida em que reclama, saiba emular. Na mesma proporção, no mínimo, que lança palavras duras, oferte palavras de afeto, acolhimento e estímulo fraterno. Se você se converter em crítico contumaz, desista de ser ouvido, porque falará sozinho, enquanto o outro cria defesas para seu discurso, quer o declare ou não. Em contrapartida, se você se mantiver como “mãezinha boa” ou “amiguinho bom”, amolentará o caráter de seu “objeto” de amor, a ponto de inviabilizar, inclusive, sua relação com ele.

(Texto recebido em 24 de outubro de 2004.)