Benjamin Teixeira
pelo espírito
Eugênia.

Vou lhe sugerir começarmos um diálogo para ser publicado.

Certo.

Houve uma ocorrência recente, que gostaria de comentar.

Pois não.

A morte de Kardec.

Você quer dizer o bicentenário de nascimento de Kardec?!…

Não, falo da ausência de comemorações e alusões à morte de Kardec (*).
As pessoas costumam comemorar muito enfaticamente o nascimento dos indivíduos, e se esqueceme de que a morte é data muito mais importante, porque marca, de fato, a glória de um indivíduo. Celebra-se o Natal de Jesus de forma muito mais enfática que sua “Ressurreição”, na Páscoa. Mas foi o término de Sua existência que caracterizou a vitória final, pois que, naquele instante, ficava certo, cristalizado para toda a eternidade, que nunca traiu Ele os seus propósitos. O mesmo, com muito maior propriedade, pode-se dizer de Kardec, por ser um espírito mais humano. Quando um missionário nasce, há uma expectativa do Plano Maior de Vida, mas não uma certeza de seu triunfo, no que concerne ao reto cumprimento de sua programática existencial previamente delineada.

Obviamente que grandes missões não são confiadas a quem possa trair-lhe os princípios ou desertar, sem a conclusão adequada do trabalho. Mas, paradoxalmente, mesmo assim, subjaz sempre o livre-arbítrio humano, com toda sua multifacética gama de possibilidades de reação e condução do próprio destino. Cada personalidade possui um tal carga intrincada de idiossincrasias e os eventos diversos que o envolverão na condição de encarnado (leia-se: embotado espiritualmente) que é virtualmente impossível prever-lhe o sucesso num determinado empreendimento existencial. O próprio codificador deixou claro isso, repetindo o que lhe fora dito por grandes médiuns em transe, que se ele falisse em seu trabalho, outro(s) viria(m) para realizá-lo em seu lugar. Ninguém, portanto, na Terra, é infalível. Assim, o nascimento, além de sua alegoria de esperança que uma nova oportunidade enseja, marca o símbolo da incógnita, ao passo que a morte retrata a glória de uma existência encerrada com brilho ou de uma vida com valor vergonhoso, limitado ou questionável. Por outro lado, a própria morte, como sabemos, representa um renascer, o verdadeiro renascimento, já que o indivíduo retoma a plenitude de suas faculdades parcialmente empanadas pelo eclipse psíquico na matéria, pela grosseria do aparelho neurofisiológico no plano físico.

Neste ano, Kardec completou 135 anos de desencarne, e não se comentou nada a respeito. Comemora-se cada data de publicação de “O Livro dos Espíritos” e mesmo de seu nascimento, mas não se toca, sequer, no assunto da data de sua introdução gloriosa no Mundo Espiritual. Isso revela, indiretamente, o horror inconsciente que as pessoas ainda preservam da morte, mesmo nos redutos espíritas, o que seria, em tese, incompreensível. Assim, essa imaturidade deve ser debelada, e o culto da morte ser celebrado, aberta e alegremente, sem mais a conotação de algo sombrio e medonho, sobre que, no máximo, se age com serenidade, mas nunca com alegria. A morte é uma libertação, o retorno ao lar, a volta ao convívio com aqueles que amamos e que se entendem perfeitamente conosco (ao menos para aqueles que trazem a consciência em paz). Deve-se focar a vida, celebrar a vida, estimular a vida, mas não ignorar o fato fundamental de que a morte é parte indissociável do processo do viver; e, inclusive, por representar sua conclusão, deve ser compreendida como o ápice da existência, ou o instante em que seus significados e finalidades mais claramente se apresentam. Não sendo assim, e estaremos agindo com extrema superficialidade de conceitos e sentimentos, ainda que sejamos materialistas; e, em comungando da convicção da imortalidade, simplesmente estaremos sendo incoerentes e indesculpáveis na própria loucura voluntária.

(Diálogo travado em 8 de outubro de 2004.)

(*) Eugênia faz uso dessas “jogadas de idéias”, com raciocínio aparentemente truncado, quando deseja romper um paradigma ou um idéia cristalizada, pela estranheza que provoca no interlocutor. A surpresa, confusão ou perplexidade (de acordo com a profundidade e a natureza do tema abordado, bem como da força com que ela apela para tal expediente propedêutico) que, com freqüência, ela causa, favorece, pelo impacto, uma mais profunda fixação do que ela quer dizer – ao menos é assim que entendo o porquê desta sua forma peculiar de ensinar (embora, obviamente, este seja apenas um entre inúmeros outros recursos pedagógicos de que ela lança mão para educar, tão brilhantemente como faz). Quanto à data de desencarne do ilustre codificador do Espiritismo, aconteceu a 31 de março de 1869, em Paris.

(Nota do Médium)

Excepcionalmente neste domingo, dia 10 de outubro (e apenas neste domingo), a palestra pública que Benjamin Teixeira realiza às 19 horas acontecerá no “Centro Espírita Filantrópico Adolfo Bezerra de Menezes”, que fica na Rua Nossa Senhora das Dores, 769, perto do Colégio Salesiano.
Equipe Salto Quântico