Benjamin Teixeira
pelo espírito
Eugênia.

Espírito Eugênia – Gostaria de utilizar a divisa de Emmerson: “I must be myself” (*), para estudarmos hoje.

Benjamin Teixeira – O que teria a nos dizer a respeito disso, Eugênia?

EE – Que o Eu-mesmo não é o que as pessoas supõem ser, num primeiro exame, e que, portanto, devem se empenhar por não confundir com seus desejos e suas carências, suas programações culturais e suas neuroses, suas fixações ou sua participação em vícios coletivos.

BT – Em resumo, o cidadão médio não sabe o que é ser ele mesmo.

EE – Exatamente. De modo geral, quando alguém diz que quer ser ela mesma está fazendo alusão a valores introjetados da família, da sociedade ou do grupo específico a que pertence, seja profissional, religioso ou político.

BT – Que fazer para realizar uma filtragem desses vetores mentais, a fim de se encontrar a verdadeira natureza?

EE – Começar pelo princípio de que a pura essência de si é inalcançável no nível humano de consciência e que sempre, em algum nível (em vários normalmente) subsistem enormes influências do meio e da educação sobre a forma de pensar e sentir o mundo, de modo que a melhor forma de se começar a diminuir-lhes a força de influência sobre si é perceber-lhes a presença e o poder que têm sobre a própria personalidade. A maior parte das pessoas sofre da grande ilusão de acreditar que seriam a mesma pessoa que são, que teriam as mesmas idéias e projetos de vida se estivessem no século XIX ou XVIII, ou se houvessem nascido em outro país ou em outra família. Ainda quando alguém difere dos vetores de consciência e idéias de um ambiente, pode ter definido sua identidade justamente através da reação e da interação com esses fatores mentais externos, assim constituindo sua identidade a partir de impulsos de contra-dependência, que não deixam de ser dependentes, num nível profundo. O ser humano é sua circunstância, muito mais do que imagina. Os pensamentos de anônimos, os juízos de valor de miríades de criaturas com quem travaram contato, pessoalmente ou por meio da leitura ou da comunicação de massa, a mídia, a cultura dominante e os diversos grupelhos culturais contra-reativos vão favorecendo uma moldagem e construção idiossincráticas de personalidade que ninguém alcança em toda sua dimensão. Somente indivíduos excepcionais (excepcionais mesmo, os grandes gênios e santos revolucionadores do pensamento humano) conseguem manter uma certa autonomia consciencial, em meio aos conceitos, valores, costumes e presunções de verdade de uma dada época e lugar.

BT – Que devemos fazer para sermos nós mesmos?

EE – Primeiro, como disse, conhecermo-nos em profundidade. As pessoas, além de todos os programas psíquicos introjetados nesta encarnação, sofrem a influência daqueles que lhe foram enxertados em encarnações passadas e no longo pretérito evolutivo, na condição animal. Os impulsos bestiais e neuróticos, assim, predominam maciçamente na psique humana média da Terra, sem que a criatura dimensione o quanto, pois que, a quase todo momento, racionaliza seus desejos e impulsos, por um automatismo psicológico do ego, dando-lhes uma roupagem civilizada, que oculta os reais propósitos, o fundo escuro e primitivo que move a maior parte dos seres humanos de nosso planeta.

BT – Está dizendo que, então, a humanidade é constituída, em sua maioria, de seres voltados para o mal?

EE – Disse “fundo escuro e primitivo” que move a maior parte das criaturas, para revelar que não há muito ideal nobre e elevado, não há muito impulso de transcendência no ser humano médio da Terra. Mas isso não implica dizer que sejam medonhos, malévolos e sinistros. Mas que são grosseiros e egoístas, frívolos e infantis, em sua esmagadora maioria e não propriamente perversos e inconscientes, como muitos pensam.

BT – Certo. Como então, destilar um pouco nossas almas primitivas, para que atinjamos níveis mais altos de consciência?

EE – Que cada um busque acentuar todos os traços de personalidade e de caráter que digam respeito aos níveis mais altos de consciência, como: altruísmo, devotamento e abnegação a causas humanitárias, devoção espiritual a Deus e a Figuras Espirituais que O representem (como Jesus), a busca sincera do conhecimento e da sabedoria (sem o fito escuso de ter supremacia sobre os outros), etc. Ninguém decida desligar-se dramática e definitivamente dos vetores mentais e morais do primitivismo em sua alma, porque, em vez de lograr seu objetivo, adoecerá gravemente, enlouquecendo gradativamente, já que esse intento é completamente inviável. Somente pelo esforço gradativo de transformação íntima consegue alguém, paulatinamente, deslindar-se dos tentáculos titânicos do passado animal, e gravitar, seguramente, para a angelitude. Trabalhar, com realismo, na auto-melhoria, fazendo ajustes sensatos, sustentáveis, sem expectativas exageradas e utópicas é um bom caminho de ascese espiritual.

BT – Mais algo a dizer sobre isso?

EE – Que se pense mais no serviço que na contemplação. Há pessoas que pretendem espiritualizar-se a partir da focalização do egoísmo nas coisas do espírito. Trata-se de um contra-senso. Cresce-se no espírito, pelo exercício do espírito, que é amor, doação, serviço, entrega de si próprio pelo bem alheio. Quem tomar caminhos místicos, metafísicos ou auto-centrados demais acabará por se envolver em ilusões também demais e, por fim, retardará o que mais busca: a introdução da própria consciência, em níveis mais altos ou complexos ou sutis de expressão.

(Diálogo travado em 22 de fevereiro de 2004.)

(*) “Eu devo ser eu mesmo”, do filósofo transcendentalista norte-americano, Ralf Waldo Emmerson (1803-1882).

(Nota do médium)