Nos últimos dois capítulos tratamos de duas figuras de escol, encarnadas na condição de riqueza material. Neste, trataremos de outra situação comum na Terra, mas que gera tremenda resistência conceptual e emocional, entre os encarnados: a existência de enviados de Deus entre os que assumem postos de poder público. Fizemos, mui recentemente, visita a Brasília, para fim específico, logo abaixo discriminado, a pedido de Anacleto, o mentor do projeto Salto Quântico.

 

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Eram cinco da tarde quando chegamos ao palácio. O gabinete sofisticado em Palácio do Planalto era, contudo, concomitantemente despojado de artificialismos – funcional, resumamos numa palavra. O Marechal Cândido estava com a cabeça enterrada nas mãos, num momento de profunda reflexão e prece. Era uma das figuras mais importantes da República e fora envolvido em tricas mesquinhas por parte da imprensa, representando interesses setorizados. Dirigente máximo do Serviço de Inteligência do país, fazia tudo para cumprir com o máximo decoro e eficiência o seu dever. Espírita convicto e médium ativo, estava cercado, naquele momento de provação, por diversos auxiliares desencarnados e grandes mentores de nossa dimensão, interessados em sustentá-lo, com dignidade e altivez, em meio à borrasca do escândalo forjado pelos inimigos da Causa e do Governo.

A sala explodia de Luz do Plano Maior de Vida. Para chegar lá, pedíramos autorização com antecedência de três dias, às Excelsas Autoridades Espirituais governantes do Brasil, a fim de que pudéssemos assistir ao desfecho dos acontecimentos em foco e relatá-los em meu novo livro enviado ao plano físico. Naquela manhã, recebi a devida outorga para adentrar o ambiente altamente protegido dos ataques das trevas, interessadas no caos e na baderna que se fariam instantâneas, caso a Mão Invisível das Potestades Angélicas não pousasse, continuamente, sobre a fronde dos governantes que, ainda que com suas imperfeições e deslizes, muitas vezes portavam sinceras boa vontade e boas intenções.

Logo entrando à sala, Celestino, um dos militares desencarnados que compunha as hostes espirituais do Plano Superior orientadoras do Marechal, acorreu à minha direção, com grande cavalheirismo tomando-me a destra e depositando um ósculo sobre ela. Muito embora tais tratamentos não fossem comuns em nossa faixa de expressão mental, alguns permaneciam afeitos a seus hábitos de fidalguia do tempo de encarnados, no que eram ciosamente respeitados. Procurando ser empática, fiz um meneio cortês com a cabeça inclinado-a para baixo, curvando levemente o dorso e flexionando sutilmente os joelhos, assim como reagiam as damas do passado a esse tipo de cumprimento.

Celestino havia sido Presidente da República brasileira no século XX, e tecia íntimos laços de afeto pelo Marechal, com quem havia se vinculado por elos de antanho. Por vários séculos associaram-se a compromissos espirituais com a coletividade, e assim permaneciam jungidos, mesmo quando não coincidiam suas reencarnações em períodos similares de tempo. Embora dotado de evolução psíquica suficiente para a comunicação telepática, o ex-presidente, muito cioso de tradições, preservava o uso de escorreito Português, em castiço estilo do início do século, incluindo o uso da segunda pessoa no tratamento com o interlocutor:

– Eugênia, é uma grande honra termos tua pessoa entre nós. Anacleto tem-nos alguma ordem? – disse, gentilmente, o ex-presidente, que estava sob o comando de autoridades espirituais de hierarquia superior à do Grande Mentor de Andrômeda.
Sorri agradecida pela deferência e respondi:
– Vim apenas observar o andamento dos acontecimentos por aqui e descrevê-los, na medida em que receber autorização de Cima, publicando minhas modestas notas, por via mediúnica, no mundo físico.
– Estejas à vontade. Sabemos que já tens as naturais reservas no que tange a comentários de ordem político-partidária, que competem aos encarnados tão-somente. Mas consideramos de muito bom alvitre a iniciativa de tornarem-se públicas algumas das complexas operações desdobradas de cá, como cobertura às autoridades terrenas, em fase de terrível descrédito ante a opinião pública.
– O exmo. ex-presidente teria algo a sugerir para nossa abordagem?
– Por obséquio, amiga, evita o tratamento formal. Chama-me Celestino apenas. Não, não teríamos nada especificamente a propor. Conhecemos sua habilidade em observar e destrinchar temáticas complicadas. Reitero que se sinta inteiramente à vontade.

Agradecida pelo que entendemos um estímulo a melhorar e não um reconhecimento que não merecíamos, fizemos algumas mesuras gentis e Celestino tornou a se aproximar do Marechal, envolto nas energias de seu mentor espiritual, entidade de venerável condição evolutiva, que aqui chamaremos de Américo.

O missionário encarnado continuava mergulhado em profunda concentração. Pedira à secretária que impedisse a entrada de qualquer pessoa, ou mesmo evitasse quaisquer tipos de interrupções telefônicas, excluindo-se chamadas do Presidente. Não chorava, mas seu estado de espírito bem que propiciaria a incontinência emocional, caso não fosse de uma fibra rara de caráter viril e nobre, que não se permitia abater nunca. O guia, logo atrás dele, afigurava-se uma explosão de luz branca, em cujo interior se poderia divisar, com alguma dificuldade, uma silhueta humana masculina. Alguns minutos se passaram, e o Grande Orientador retomou forma humana, que quase perdia, quando em profunda concentração, e, retraindo seu gigantesco campo áurico, veio em minha direção. Coloquei as mãos no coração, em atitude reverente, e recebi suas palavras com a alma:

– Minha filha: diga ao mundo que os Governantes são também filhos de Deus; almas de grande envergadura evolutiva, que descem ao proscênio das labutas terrenas, para desempenhar alto mister de orientação das coletividades, rumo ao progresso e a paz. Ocorrem, indubitavelmente, grandes desvios, desmandos e sérias deturpações das finalidades do poder, mas há também daqueles que, pelo mal da maioria, pagam alto tributo de dor moral.

Esse homem possui um coração bom e nobre, que sofre terrível injustiça; e o seu chefe é notável professor do Além, que se preparou por inúmeras reencarnações, para desdobrar essa missão grandiosa de recolocar o Brasil no rumo do crescimento e de gerar as iniciativas governamentais adequadas a uma definitiva introdução nacional, gradativa mas efetivamente, no colégio dos grandes países-líderes do planeta. Você será incompreendida por levar ao plano físico essa mensagem, mas tem plena ciência de que isso é necessário, sempre que se trata de revelar algo de novo à resistente mente humana terrícola à mudança. Agradecemos sua iniciativa e, se possível, peça a seu médium que confirme o que temos dito diretamente a Cândido, por meio de suas faculdades mediúnicas, de que ele está passando por uma prova necessária e de que não tem nenhuma razão para que se sentir culpado ou negligente: o escândalo estouraria de qualquer forma, por mais previdente ou lúcido que fosse em todos os seus atos.

Por fim, quero que envie aos encarnados a mensagem de que urge que gente decente e sinceramente devotada à espiritualidade se interesse por política e pelo poder, ou os altos postos de comando do poder público continuarão entregues às traças. Claro que nunca se poderá misturar liderança espiritual com política. Os expoentes das religiões devem permanecer distanciados do poder público, mas entre os adeptos sinceros da luz religiosa, sobremaneira a espírita, pervaga um preconceito injustificado com a política, que pode, inclusive, em alguns casos, constituir terrível omissão e criminosa negligência em se participar dos grandes acontecimentos e decisões de destino para as coletividades.

Enxuguei algumas lágrimas, envolvida em ternas lembranças de encarnações remotas, em que estive próxima a pessoas encarapitadas em alta condição de poder, e, agradecendo a gentileza imensa da exposição direta de Américo, a alma angélica que absorvia a missão de mentor de Cândido, recuei, satisfeita, após despedidas calorosas de Celestino, para o exterior do prédio.

O crepúsculo já estava avançado na belíssima capital brasileira, declarada, por organizações internacionais terrícolas, patrimônio da humanidade. Volitamos sobre Brasília, por alguns momentos e, após contemplá-la com carinho, exorando as bênçãos do Céu para o cérebro do Coração do Mundo, transportamo-nos para Aracaju, em busca de nosso médium, para o trabalho de comunicação interdimensional da noite.

Eugênia-Aspásia (Espírito)
Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
19 de novembro de 2000