Benjamin Teixeira
pelo espírito
Demétrius.

Você é um caleidoscópio psíquico. Não pretenda ter uma face ou uma cor mental apenas ou comprometerá severamente a multidimensionalidade que caracteriza as estruturas de sua mente.

Se você pretende ser apenas pai, o “pai” se fará tirânico e caprichoso, a fim de revelar sua “criança interior”, carente de traquinagens. Se você, de reversa maneira, procura ser apenas “filho”, soará, amiúde, manipulador e perverso, para exercer o poder de que carece, na condição interior de pai, que precisa manifestar sua função psíquica de exercício de poder.

Apesar de homem predominantemente, sua mulher interior quer ter espaço a falar. Se não lhe dá cidadania, ela irromperá de forma mesquinha e melodramática, num surto de cólera aparentemente masculino, mas que não passará de uma grande crise histérica da mulher ferida que não foi ouvida. Assim também, se você é mulher, seu homem íntimo deseja ter vez e voz, e se você não lhe oferecer guarida, na cidadela de sua alma, eis que ele explodirá, como teimosia, grosseria, brutalidade e violência, física ou verbal, extravasando sua energia viril, que foi contida. O lado negado da psique permanece vivo, e, subdesenvolvido e reprimido, degenera para suas piores expressões.

Se você não der extravasão ao sábio, ao herói, ao curador, ao atleta, ao palhaço, ao religioso, ao místico, ao guerreiro, à virgem, à santa de dentro de si, não viverá plenamente e as neuroses e conflitos diversos, seja dentro de você, seja por meio de reflexos variados no mundo externo, virão dar notícia da coagulação dos fluxos da Vida, que estará travada, dentro de você, por negligência ou supressão que haja empreendido no próprio organismo mental.

Atente-se para os preconceitos. Muita gente deixa de viver seu lado sensível, por ser homem. Outro enorme grupo deixa de exprimir sua assertividade e indignação justa, por ser mulher. Outros tantos deixam de brincar e relaxar, por serem “juízes”, “sacerdotes” ou “autoridades”. Não imponha barreiras à própria natureza. Eduque e administre a manifestação de si, mas não reprima, desautorizando a existência de elementos indissociáveis de sua própria essência, porque eles não deixarão de existir por causa disso e lhe cobrarão pesado de tributo em desajustes de seu comportamento ou em eventos nefastos em seu destino, como vindita implacável por seu desprezo por eles.

Não importa que dê nomes elegantes para essas estruturas e fragmentos de sua própria personalidade, usando jargão técnico das escolas diversas de psicologia, incluindo a profunda – puer e senex, anima e animus, Self e Sombra, id e ego, superego e superconsciência. O que interessa é que descubra, dentro de si, os papéis-funções psicológicos, que existem, como constituintes das teceduras de seu psiquismo, que pedem, portanto, expressão e ulterior integração, na totalidade da consciência.

Obviamente que esta expressão pede cuidados, bom-senso e responsabilidade, respeitando-se, inclusive, o nível de percentuais de cada “personagem oculto” no campo da própria psique. Mas a livre expressão de todos os departamentos da geometria fractal da consciência é indispensável para uma vida psicológica saudável (*2). Há psiquismos que têm menos ou mais deste ou daquele fator arquetípico constituinte. Há, de fato, espíritos mais ou menos femininos ou masculinos, mais ou menos sábios, ou santos, ou guerreiros. Mas, seja qual for a faixa, na escala evolutiva dos seres, a que você pertença, sejam quais forem os aspectos menos desejáveis ou menos dignos que porte em si: deixe-os virem à tona, com equilíbrio e sensatez, para que eles não venham a emergir na sua conduta, ao modo deles, embrutecidos com a compressão para “baixo”, degenerados nos subterrâneos da inconsciência. É por conta desta ordem de desequilíbrio íntimo que as obsessões, as compulsões, os deslizes da ética e as hipocrisias surgem. Ou seja, paradoxalmente, os que mais lutam para dominar seu lado primitivo ou indesejável podem sofrer uma exacerbação do mesmo. O lado primitivo não é para ser eliminado do psiquismo e sim desmantelado em seus elementos constitutivos menores, para que possa essa energia fundamental ser reaproveitada, através da canalização, em outras áreas e atividades, mais nobres e construtivas.

Entretanto, não se pense que será possível total re-direcionamento dessas forças selváticas, ou, como diz o jargão técnico psicanalítico freudiano: a “sublimação” da libido só ocorre em seu excedente, e não em sua totalidade, como pretendem alguns entusiastas da espiritualidade, por exemplo, fanatizados em seu idealismo utópico e perigoso, porque presunçoso e passível de gerar verdadeiras aberrações contra-reativas à repressão, como a história das religiões bem atesta, propiciando os maiores atos de barbaria que jamais o gênero humano perpetrou. Tal empreendimento de “iluminação”, portanto, pode redundar em terríveis experiências de frustração, porque, simplesmente, não se pode determinar o que existe ou não na própria psique. O respeito à própria estrutura mental é a “conditio sine qua non” (*3) para haver algum êxito na gerência da própria casa psíquica.

É por meio, inclusive, dessas “chaves de sintonia” destrutivas que agentes do mal, no plano físico ou no extra-físico de vida, têm acesso à casa mental de gente “decente e pacata”, mas sem auto-conhecimento e inseguras quanto ao mundo (o que lhe é natural decorrência). É através da ressonância com as partes de nós mesmos pouco desenvolvidas e/ou pervertidas e/ou perversas que as agências do mal patrocinam a destruição da criatura e das comunidades, pela ativação e potencialização destes tais pontos e inclinações devastadores do indivíduo e dos grupos humanos (a psicologia de massas que o diga).

Não se trata de algo difuso, complexo e técnico demais, que não possa ser bem facilmente aplicável.

Assim, machões, não queiram ser atletas-dominadores-da-cena-do-sexo, quando estiverem com suas “princesas-submissas”, ou, cedo ou tarde, a “fêmea frágil” dentro de si pedirá socorro ao “herói salvador” do interior de sua consorte, através do drama ímpar da impotência sexual, por exemplo.

Você, que se sente responsável por todos, forte e senhor da situação, faça biquinho com sua esposa ou com seu terapeuta, sinta-se regredido à condição de uma criança de sete anos, e, amuado e dengoso, reclame da falta de amor em sua vida ou demonstre qualquer tipo de vulnerabilidade que “lhe der na veneta”, nesta “incorporação” do fragmento infantil de sua psique. Se não fizer isso, esse “moleque” interior poderá sabotar seus melhores projetos, fazendo-o perder o emprego ou ir à falência nos negócios, para que tenha ocasião de revelar sua sensação de desamparo e fragilidade.

Você, que se sente na obrigação de ser amável e doce, como boa moça, aprenda a ser assertiva, direta e corajosa, em exprimir sua opinião e pedir o que deseja ou acha justo ou certo, como seu “homem interior” lhe pede, para que não venha a precisar ter um surto histérico na empresa, desabando em ofensas diretas e inconcebíveis, dirigidas, extemporaneamente, ao chefe e a colegas, precipitando sua demissão, nem numa “irresistível” tentação extra-conjugal “com o melhor amigo do esposo”, onde, então, seu “macho desafiador e volúvel” venha a gritar seu urro primal de existência.

Você é quem é, embora possa vir a melhorar e se tornar algo mais. Todavia, para que isso aconteça, deverá partir do princípio de aceitação e respeito, primeiramente, do estado de desenvolvimento em que se encontra no presente, para, somente depois disso, poder se candidatar a um patamar melhor de consciência, por meio da saturação do nível atual, e da conseqüente e natural superação do mesmo, pelo único meio que há: a travessia do caos, que motiva o turbilhão do progresso e gera o efeito turbo das grandes transformações.

Você não é mulher, homem, professor, estudante, político, gay ou ativista ecológico, cristão ou espírita, pai ou filho, cônjuge ou sócio ou qualquer outra coisa. Você é um conjunto de vários ou de todos esses vetores conscienciais, em níveis diversos de concentração, interpenetração, combinação e intersecção de forças mentais, num apanhado originalíssimo que não só nunca vai se repetir na história da criação, em outro indivíduo, como, em você mesmo, jamais terá repetição idêntica, da forma que hoje é, como sente o mundo, como interage com ele.

Assim, você não é: você está. É e não é tudo. É e não é coisa nenhuma. Tudo isso ao mesmo tempo. Se você não é uma sala de espelhos psicológica, se você não se vê como um grande camaleão psíquico, um condomínio de identidades e papéis sociais e espirituais, provavelmente conseguirá se integrar à “normalidade” da vida humana de hoje. Entretanto, jamais estará em paz e muito menos, atingirá qualquer nível duradouro e profundo de felicidade, nesta ou n’outras vidas.

(Texto recebido em 27 de outubro de 2004.)


(*1) Já amanhecendo o dia, após uma dia inteiro e ainda mais uma longa noite e toda uma madrugada trabalhando ativamente com a mente, recebi esta mensagem, com tanto sono que mal conseguia manter os olhos abertos. Eu mesmo fiquei impressionado com a facilidade com que Demétrius conseguia mesmo assim escrever por meu intermédio, dentro de um tema tão complexo e profundo e fazendo uso de um linguajar e um encadeamento e idéias surpreendentemente didáticos, o que mais ainda exige criatividade e inteligência. O meu lado de “cientista-observador” do fenômeno mediúnico ficou deslumbrado com esse evento curiosíssimo, bem revelando a total independência das entidades comunicantes, em relação à mente intérprete do medianeiro. Um detalhe adicional, sobre esse artigo ainda, que me chamou a atenção, considerando o estado de quase colapso nervoso em que estava quando o psicografei, é que quando fui corrigir, dias mais tarde, para a publicação neste site, quase não havia nada a ser retocado. A mensagem, mais do que o normal, “desceu” pronta e “impecável”.

(*2) A Geometria Fractal é uma das mais avançadas e novas vertentes da matemática, que trata de “superfícies” e fenômenos “rugosos”. É um dos braços importantes da Teoria do Caos.

(*3) Condição indispensável para que alguma coisa exista ou aconteça.

(Notas do Médium)