(Eugênia-Aspásia)
– Creio que possamos começar com a carta a seu amigo de Maceió.

(Benjamin Teixeira de Aguiar) – Obrigado, Eugênia! Estava esperando que você atendesse à consulta que ele lhe endereçou na semana passada, por meu intermédio.

(EA) – Consideramos, antes dos elos do coração, os interesses coletivos. Ele nos merece uma atenção especial agora, por se mostrar disposto a colaborar com a nossa causa, que auxilia milhares de pessoas a despertarem para a verdadeira vida.

(BTA) – Que bom…

(EA) – Conhecemos o fundo dos corações, meu filho.

(BTA) – E o que teria a dizer sobre o fato de nosso consulente achar a vida sempre difícil e travada em diversos âmbitos? Perguntou-me ele se você teria algum alerta a lhe fazer, em nome da Espiritualidade Maior, no sentido de lhe fomentar o autoaprimoramento e, assim, favorecer um fluxo de melhores acontecimentos em seus caminhos.

(EA) – A pergunta veio muito a calhar. Você mesmo notou, no transcurso da conversa com seu amigo, um ponto nevrálgico que representa o busílis da questão: ele sente faltar algo essencial em sua existência, uma lacuna que lhe gera uma sensação de vazio impreenchível. Curiosamente, ele próprio já intui o caráter dessa falta: uma necessidade de buscar o numinoso, o transcendental, uma sede de espiritualidade que não pode mais ser ignorada nem procrastinada.

O “milagre moral”1 que ele vivenciou, invocando a Presença e Intercessão de Jesus, após uma preleção nossa, não se deu ao acaso. O aprendiz se revela fértil à semeadura do Alto, quanto sequioso de que a Linfa Divinal lhe irrigue a gleba árida do coração, ressequido pelos duros embates e pela canícula causticante que caracterizam o deserto das relações profissionais, via de regra desconectadas do senso de humanidade e respeito aos sentimentos alheios, porque completamente dominadas por competitividade e agressividade exacerbadas.

A emergência espiritual que lhe surge palpitante e quase dolorosa, na forma de tédio, modorra ou desmotivação profunda para viver, é inadiável, como afirmamos acima, e decorre do encerramento do ciclo de maturação psicológica do ego. Não queremos dizer, com isso, que ele deva solapar de todo as expressões emocionais e operacionais relacionadas à mente de vigília, ao núcleo decisório da personalidade que constitui o ego. Esse centro deliberativo continuará existindo, enquanto a criatura transitar no nível hominal de consciência, estando insulada no veículo de carne ou deslindada da dimensão material de vida.

Aludimos ao fato de que esgotou para o nosso irmão em Cristo o período evolutivo de prevalência do ego sobre outras funções da psique. Por conseguinte, se ele não trafegar para atividades, ocupações e valores de ordem transpessoal – ou seja: acima do estágio pessoal (ou egoico) de evolução –, nada funcionará apropriadamente em seu destino, podendo lhe advir crises de ruptura e disfunção ainda mais dramáticas, como fracasso profissional, falência matrimonial ou colapsos no campo da saúde física e do bem-estar íntimo. Ele deve, pois, dedicar-se a obras e ideais com que se afine, obviamente, e que correspondam e atendam a essa sua premência de espiritualidade.

(BTA) – Esse movimento de aproximação à nossa instituição seria uma boa opção para ele?

(EA) – Você se exprimiu bem ao empregar, em sua interrogação, o artigo indefinido “uma”, já que a nossa não é a única senda para a Divindade – embora possa ser a preferencial para ele, em particular, conforme escalas de afinidade que somente a própria consciência deve aferir, no livre gozo de seu discernimento.

Evidentemente, nossa organização consiste em uma boa alternativa para ele, que demonstra receptividade ao gênero de orientação que oferecemos, chegando inclusive a nos dirigir consulta. Todavia, qualquer linha ou tradição espiritual pode ser uma rota genuína para Deus, quando seguida com sinceridade, empenho e perseverança. A questão toda é haver um grau suficiente de paridade principiológica entre o(a) discípulo(a) e sua escolha religiofilosófica, de tal maneira que ele(a) se sinta “em casa”.

Por esse prisma, compreendemos que nossa escola de pensamento seja apropriada a um homem inteligente, instruído, viajado e moderno como ele, pouco afeito a doutrinas castradoras das liberdades individuais e eivadas de preconceitos anacrônicos. Uma vez que primamos por respaldar, racional e (quanto possível) cientificamente, nossas proposições psicoespirituais, mas também apresentamos uma abordagem pragmática para a administração da existência humana, tendo em vista a finalidade precípua de promover a felicidade, sem dúvida o sistema de nosso educandário se coaduna em muito com o perfil do estimado consulente, bem encaixado no modelo ianque do “self-made man”.

(BTA) – Você poderia detalhar algumas sugestões práticas, Eugênia, para ajudá-lo a aplacar um pouco o desânimo e melhorar imediatamente sua relação com a espiritualidade?

(EA) – Oração diária, indiscutivelmente, seria o primeiro tópico a aventarmos. Ninguém deveria iniciar seu dia de trabalho ou sair de casa, antes de se dedicar, ao menos por 15 minutos, a exercícios meditativo-oracionais, em preito de reverência ao Ser Supremo ou a Seus(Suas) Representantes, como Nosso Senhor Jesus e Nossa Amantíssima Mãe e Senhora, Maria de Nazaré.

Um segundo item seria aquele que você já lhe sugeriu, no diálogo fraterno que entabularam: a frequência assídua a uma reunião hebdomadária de prática espiritual ou busca coletiva de transcendentalidade.

O terceiro é exatamente o que motivou a autorização a falarmos diretamente com o companheiro em ideal: sua colaboração com a campanha de disseminação da Luz da Verdade no mundo das sombras. Quem coopera com a difusão da Luz Divina é o(a) primeiro(a) a ser iluminado(a). A indefectível Lei de Justiça, neste universo de Infinita Bondade e Perfeita Sabedoria, manifesta-se pujante, mormente quando se trata de matérias sagradas como à que nos devotamos: divulgação de princípios humanístico-espirituais, com um lastro consistente e palatável aos(às) cidadãos(ãs) mais esclarecidos(as) da população atualmente encarnada no orbe.

(BTA) – Querida Eugênia, nosso amigo esperava que você lhe apontasse falhas morais ou deslizes de conduta, para que ele os corrigisse.

(EA) – (risos) E você acha pouco o que indicamos? “Buscai primeiramente o Reino dos Céus e Sua Justiça, e todas as demais coisas vos serão acrescentadas”2 , lecionou também Nosso Mestre inolvidável. O indivíduo que se mantém distanciado do(a) Criador(a) comete faltas muito mais graves e frequentes, no agir, no pensar e no sentir. Logo, refazendo a comunhão com a Origem de Todo Poder e Solução, o demais se resolve natural e progressivamente, na medida em que as problemáticas perdem importância e força, no concerto dos vetores mentais que compõem a psique total – múltipla e mutante, por natureza, porque em processo contínuo de integração e evolução.

(BTA) – Você falou sobre a passagem do nível egoico ao transpessoal de consciência. Poderia discorrer a respeito da fase anterior à egoica?

(EA) – Sim. Ela pode ser denominada de “pré-egoica” ou “pré-pessoal”. Está no capítulo do que alguns(umas) psicólogos(as) conceituaram de “participation mystique”3 . É o domínio tribal de consciência. Os(as) integrantes de uma aldeia interagem como se fossem parte de um organismo mental único. Podem, dessarte, se atirar a rompantes de autossacrifício que facilmente nos remeteriam ao espírito de martírio e renúncia dos anjos.

Em verdade, no entanto, esses entes primitivos gravitam em torno do extremo oposto do espectro evolucional: não têm consciência clara do “si-mesmo” e, por isso, sequer cogitam de prejuízos pessoais ao se precipitarem na defesa de seu grupo. Já a alma que habita a esfera “suprarracional” ou “transpessoal” de evolução tem plena consciência de si, ao abdicar dos próprios interesses em favor de um propósito maior, ainda que voltado a alguns(umas) poucos(as) beneficiários(as).

O(a) silvícola original4 que por impulso se expõe a risco, no afã de garantir o bem da coletividade, age à guisa de um inseto social5 que opera instintivamente, no circuito complexo do funcionamento de sua comunidade. Em contrapartida, o(a) santo(a) que imola seu corpo, sua mente, sua vida, em prol de um ideal humanitário, lembra a mãe que oferta o seio ao(à) filho(a)-bebê, permitindo-se “vampirizar” pelo rebento, mesmo que esteja igualmente faminta, para dar do que não tem ao fardo precioso de seu coração.

Decerto que o elemento instintual de preservação da prole ainda está presente nos gestos de autodoação maternal, sobremaneira se há laços de consanguinidade. Não obstante, recorremos a essa pobre analogia por falta de outra que melhor retrate os arroubos de amor incondicional que nutrem e movem os espíritos realmente redimidos, residentes em patamares sobre-humanos de consciência – os budas da compaixão ou, segundo a terminologia budista, “bodhisattvas”, que renunciam ao regozijo de mergulhar definitivamente no nirvana para servir, sem qualquer intuito de retribuição, aos seres menos desenvolvidos da Criação, acelerando-lhes a chegada ao porto glorioso de bem-aventurança eterna.

(BTA) – Você nos autorizaria prepararmos uma reunião mediúnica íntima, a fim de que ele receba a bênção de sua visita, por meio de minha muito limitada pessoa?

(EA) – Não o julgamos limitado (não para essa tarefa) nem vemos nossa visita como uma bênção, a não ser que nos considere uma emissária de Maria Santíssima: Ela, sim, Fonte inexaurível do Amor Imaculado de Deus, que nos quer a todos(as) repletar de paz e felicidade, em todos os sentidos. Sim, autorizamos a visita para o intercâmbio medianímico.

(BTA) – Agradecido, Eugênia.

(EA) – Transformemos nossa gratidão em mobilização pelo bem comum. A Espiritualidade Sublime é regida por diretrizes inamovíveis que determinam seja concedido maior auxílio a quem mais socorros preste a seus irmãos e irmãs em humanidade. Desejosos(as), então, de uma mais ampla assistência do Plano Excelso, façamo-nos canais da Providência Celeste para nossos semelhantes.

Exortamo-los(as) todos(as), assim, a darem continuidade, sem desânimo, aos projetos e empreendimentos atinentes à expansão do alcance de nosso discurso de espiritualidade universalista. Pondere o prezado amigo sobre a extensão de méritos implicados na iniciativa de propiciar a incontáveis corações sofridos e desesperados, dos dois lados da vida, o acesso a mensagens de esclarecimento e conforto espirituais, com uma feição despojada de quaisquer laivos catequético-doutrinários, e terá notícia da chuva de bênçãos e graças que atrairá para sua própria existência.

(BTA) – Mais algo a dizer, Eugênia?

(EA) – Não, satisfeita.

Benjamin Teixeira de Aguiar (médium)
em diálogo com Eugênia-Aspásia (Espírito)
11 de janeiro de 2009

1. Após assistir a uma palestra do orientador espiritual Benjamin Teixeira de Aguiar, o referido condiscípulo solicitou, em prece, a graça de deixar o tabagismo e, desde então, parou de fumar, não mais sentindo necessidade do cigarro.
(Nota da equipe editorial)

2. Mateus 6:33.
(Nota do médium)

3. Conceito cunhado por Carl G. Jung, a partir de estudos sobre “psicologia primitiva”, levados a cabo pelo psicólogo francês Lucien Lévy-Bruhl.
(Nota do médium)

4. Eugênia o(a) distingue de autóctones componentes de tribos civilizadas da atualidade, às vezes bem inseridas no contexto da cultura pós-moderna.
(Nota do médium)

5. Formigas, cupins, abelhas, vespas etc.
(Nota do médium)