por Benjamin Teixeira.

Uma amiga querida, recentemente, num tom amoroso mas súplice, pediu que eu parasse de fazer questão de dizer em público que sou uma pessoa comum, porque, na visão dela, estava óbvio que eu não seria, e porque a massa precisava de ter alguém para admirar, como referencial para o caminho espiritual, e que era minha função ser um elemento simbólico e outros argumentos do gênero. Bem, vou dizer porque faço tanta questão de dizer que sou comum: porque sou. Minha amiga pode até ter razões nobres, por detrás de seu pedido, imbuído de sentimentos sinceros, preocupada com o andamento da causa de espiritualização da humanidade, mas creio que constituiria um desserviço eu me prestar a ser um “ídolo de barro”, e, por isso, prefiro estimular as pessoas em uma muito mais correta, justa e genuinamente espiritual busca de referenciais internos, no coração de cada um.

Já disse em outras ocasiões, que os espíritos me convenceram de ser a pessoa adequada para o trabalho de divulgação em massa do Espiritismo, justamente por não ser santo, nem uma alma “iluminada”. E, então, outros amigos, na intimidade, fazendo coro àquela alma boa que aludi acima, sorriem entre si, como a dizerem, sem palavras: “Nossa! Como ele é humilde!” Isso me angustia profundamente, em algumas situações, porque não estou sendo humilde ao dizer isso, mas revelando um fato: não sou uma alma de luz, no sentido que se dá a esse termo. E se tenho “luz”, é como todo ser humano tem, em gérmen. Ou, em algumas situações, se acontecem algumas curas estranhas ou fenômenos invulgares em torno de minha pessoa, isso ocorre por ser eu canal de seres realmente luminosos, os amigos espirituais que represento no plano físico.

Mas, para ainda não parecer que estou sendo modesto, vou falar mais abertamente, confidenciando-me como fiz a alguns poucos amigos, na intimidade. Por que os espíritos me escolheram, já que sou eu comum, e não outra pessoa “comum” qualquer? Qual o diferencial que fez com que eles optassem por mim, em encabeçar esse projeto, em área tão melindrosa e basilar quanto a espiritual? É porque sou um comum mais comum do que deveria ser. Explicando-me melhor: sou um retardatário evolutivo. Tenho a vívida convicção de que sou “o último da minha turma”. Desde criança, olhava para os adultos e sentia que todos, não importando que idade tivessem, eram muito mais novos que eu. Deliciava-me com algumas brincadeiras de criança, como até hoje me concentro em artigos ou filmes cômicos, para me afastar da voragem de uma tristeza medonha, infinita… que me consome desde tenra idade… Mais do que uma trágica ironia, trata-se de uma dramática necessidade psicológica e principalmente espiritual, eu ser o porta-voz de uma filosofia espiritual que prega a felicidade como alicerce conceitual. Fui uma criança bem tratada e educada, mas era comum esconder-me para chorar copiosamente, no afã de aliviar uma tristeza descomunal que me aparecia do nada, qual uma goela sangüissedenta, sequiosa de devorar minha alma… Era tão terrível esse sentimento, que muito raras vezes o disse a alguém (na época, nunca) e hoje faço-o pela primeira vez em público. Temia que, ao falar, perdesse o fio de controle que julgava ter sobre ele. E alguém me perguntaria por quê. Como alma velha, presa a antigas experiências repetidas, isolado daqueles que amava, e, para completar, com a sensação de desconforto infinito pela perda de sucessivas reencarnações, sofro de um saudosismo indisfarçável e de uma sensação de vazio e de remorsos indefiníveis do que não posso, por ora, recuperar ou pelo que, ainda, não posso me ressarcir por inteiro.

Pode parecer irônico, mas hoje me sinto uma pessoa feliz, muito feliz, embora, volta e meia, atormentado, ainda, pelas vergastadas daquela antiga e indescritível voragem de angústia existencial. E por que posso dizer que sou feliz? Porque encontrei a única forma de vida que me alegra o espírito: o contato direto com a Luz Divina e Seus representantes luminosos. Somente Eles me separam da total consumição na loucura e no desespero. Exagero? Posso garantir que não, de dentro da perspectiva de meu próprio coração. E, como sou o psicotipo mais difícil de ser contentado, posso garantir que essa felicidade é maior do que tudo que pode haver neste mundo: falo de cátedra.

Meus amigos e familiares originais – aqueles que foram meus companheiros dos primeiros passos na humanidade – estão agora muito longe de mim. Todos eles residem em freqüências espirituais sublimes, como é o caso, de modo bem peculiar, da minha doce e sábia mãe de antigos evos, hoje o grande anjo-gênio Eugênia. E eu, como um grande repetente evolutivo, uma alma que, por séculos sucessivos, foi refratária aos ditames do progresso, fiquei para trás. Uma enorme dor moral se abate sobre mim, quando tenho que reconhecer isso, numa mistura de remorsos e vergonha, que prefiro não aprofundar, para não ser por ela tragado. Sinto o peso de milênios de negligência e vício que agora tenho que compensar em espaço curtíssimo de tempo.

As pessoas me vêem extremamente disciplinado, com uma mente lúcida e uma percepção psíquica afiada. E, de fato, para os padrões da Terra, eu porto tudo isso em medidas consideráveis. Mas, quanto ao meu sentimento sobre isso, perguntaria como se sente o adolescente em idade universitária entre crianças de primário… O deslumbramento delas, com as faculdades “avançadas” do colega mais velho, em nada retirariam a angústia e a vergonha do rapagão em carteiras para crianças. É exatamente assim que me sinto.

Aos 12 anos, li, pela primeira vez, o “mito da caverna” de Platão. Duas angústias se me assomaram à alma: tinha a nítida impressão de que não estava compreendendo toda o alcance daquela metáfora, pelo que me sentia horrivelmente mal, intelectualmente limitado, e, por outro lado, uma fortíssima empatia, como se aquela figuração retratasse exatamente meu estado de espírito… a vida vislumbrado, como sombras no fundo de uma caverna… Diante disso, creio que dá para se ter uma idéia do por que não ter dado a mínima para o choque de meus colegas de faculdade e meus pais, quando larguei o curso de Direito no último ano, ou para os “rios de dinheiro”, como diziam que poderia amealhar com minha verve. Também dá p’ra entender porque não estava “nem aí”, como diz a música da parada de sucesso, quando me propuseram me candidatar a cargo público. Lembro-me do olhar da pessoa, já passados 10 anos desde o episódio, um olhar meio céptico de interrogação conflitiva, ao notar que, sinceramente, o “poder” não me atraía. E isso estendendo para todas as demais grandes “curtições” da vida. Fui até elas, esforcei-me sinceramente por me identificar e me animar com todas elas (risos) – naquele tempo preferia supor que sofria de algum tipo de distúrbio mental brando, por não me enquadrar a nada – e, por fim, acabei por me descobrir… digamos… serenamente entediado. Sinceramente, também não estava interessado em representar o papel do “menino almofadinha”, ou do “cara certinho boa-praça” (sempre detestei convenções e tive até uma certa satisfação em contrariá-las, por diversas vezes, por sentir que me privavam de uma das poucas virtudes que podia enxergar na vida: liberdade): o que, francamente, seria extremamente infantil. Brinquei carnavais na adolescência, fui a boites, fiz sexo com pessoas, comi várias vezes pratos saborosos (essa parte da vida aprecio ainda, até hoje, graças a Deus! (risos)), detestei experimentar bebidas alcoólicas… e… para tudo, disse, com enorme angústia d’alma: “E daí? E daí? E daí?”, com um enorme vazio, em seguida, tomando-me o coração.

A Luz Divina, a pequena parcela de esclarecimento espiritual que consegui conquistar (apesar de minhas numerosas limitações) e o poder de passar adiante isso tudo (ainda que também precário) são as únicas coisas que me mantêm vivo. As únicas mesmo. Ver as pessoas sorrirem, felizes, por essa mensagem chegar até elas, é tudo que desejo fazer e continuar fazendo, porque respiro e vivo isso, continuamente: é o meu oxigênio psicológico.

Assim, é uma pena que, no esforço de responder ao pedido de minha amiga, tenha feito exatamente o contrário, porque nem estou preocupado em parecer modesto, nem em impressionar ninguém, o que pode, além de parecer antipático (soando arrogante ou presunçoso em alguns pontos – mais bonitinho é ser falso e passar de “bonzinho”, mentindo bastante e encenando aquela carinha e aquela vozinha de “alma humilde”), ainda contrariar o estereótipo do “ser de Luz” que muitos desejariam ver encarnado em mim. Se quiserem, portanto, um auto-retrato meu, lá vai: um demônio convertido ao bem, um verme que quer servir a Deus e uma “coisinha do pântano” que descobriu que a Luz é o melhor negócio do planeta!

Espero que tenha sido convincente (com a mais “esperta” e persuasiva de todas as metodologias de comunicação: a sinceridade), porque, se tiver alcançado êxito nesta iniciativa, talvez coopte, com esse artigo, mais alguns adeptos para a felicidade intraduzível de se conectar a Deus e às Forças que O representam, pela prática da oração, pelo exercício da meditação, pelo conhecimento espiritual e psicológico (de profundidade) e, principalmente, pelo serviço à humanidade.

Desejo, do fundo do meu coração, a você que me lê, que gaste menos tempo que eu, nos sinuosos percursos da evolução, para descobrir essa felicidade incomparável, e a usufrua agora mesmo ou quanto antes. Tenho enorme satisfação em ver que muitos, diferentemente de mim, conseguem se tornar felizes, verdadeiramente felizes, no alinhamento com a Luz Divina, mais cedo e mais eficientemente do que fiz. E, pelo tanto que conheço da dor ciclópica do desalinhamento, bem como, por outro lado, da alegria inenarrável do reencontro com o Divino, do que depender de meus esforços, estarei dando a minha vida, para que o maior número de pessoas, da forma mais simples, rápida e eficaz possível, seja salva da angústia imensurável da desconexão de Deus, aliás como já tenho feito, desde a adolescência, parando tudo em minha existência por essa causa, pondo-a acima de mim mesmo, até o ponto de confundir as próprias fronteiras de minha identidade com esse ideal.

(Texto redigido em 9 de julho de 2004.)

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Benjamin Teixeira,
Aracaju, 12 de julho de 2004.