O essencial, em ética é ser espiritual. Há quem seja ético e sofra terríveis penas, porque está com o objetivo velado de se beneficiar com a conduta reta. Por outro lado, há pessoas que cometem alguns desdouros, vida afora, e, no entanto, a vida parece premiá-las, como se houvessem agido certo a todo tempo. Contradição? Oh, não. Trata-se de justiça: fizeram o seu melhor e são reconhecidas por isso. Não faço aqui referência aos ladrões que são entronizados no poder ou aos corruptos que se locupletam sobre a boa vontade e boa fé alheias. Trato de algo mais complexo e sutil- daquelas questões relacionadas à dignidade, como o marido que trai e é perdoado, após corrigir sua conduta, mas outro, que se esforça para vencer sua natureza volúvel continuamente, jamais incorrendo em deslize, e que é continuamente azucrinado pela esposa por motivo nenhum. Talvez esse último não traia não por falta de vontade, nem por uma especial dignidade, mas para manter a imagem impoluta, ou por simplesmente não ter coragem de enfrentar a situação, a tensão e eventuais consequências, como no caso de a esposa vir a descobrir as escapadas.

Por favor entenda-se que não estou sugerindo a ninguém soltar seus impulsos. Isso seria propor o retorno à selva. Os limites que a civilização impõe, os preconceitos da sociedade que exigem disciplinas são altamente salutares, facilitando o processo de amadurecimento da alma. Todavia, existem circunstâncias-limite, em que o indivíduo não incorre em erro, como no caso hipotético que acima apresentamos, não por grandeza moral, e sim justamente pelo contrário: por vaidade e covardia. E, francamente, nesse ponto em que o cinza do certo/errado se faz bem denso, quem dirá qual atitude seria mais correta? Jesus certa vez disse: Que seu sim seja sim, que seu não seja não. No Apocalipse, pela interpretação mediúnica de João, afirma novamente o Mestre: Sede quentes ou frios: eu vomito os mornos.

Claro que não vamos propor aqui qualquer retorno ao maniqueísmo primitivo – isso seria, inclusive, entrar em contradição com nossas próprias ideias, expendidas em outras, numerosas oportunidades. O que aqui quero chamar atenção é o fato de que não é o ato em si que envilece o indivíduo ou não, mas sim as intenções que lhe subjazem. E o mundo, apesar de tão acusado de cruel, amiúde reconhece isso. Não por acaso, religiosos hipócritas são encarados com desprezo, enquanto celebridades chulas, com vocabulário escatológico e conduta vulgar, amiúde são observadas com simpatia e aceitação terna.

Nessa época do politicamente correto, em que as pessoas se preocupam demais com as aparências ideológicas, negligenciando a essência dos sentimentos, muita gente quer parecer ética e alardeia honestidade, como se fosse possível parecer decente, por representar um teatrinho de dignidade. A integridade é como que uma aura que envolve a pessoa, uma atmosfera que é, por assim dizer, exalada de sua alma, e diz respeito, fundamentalmente, ao indivíduo estar sendo coerente com seu nível evolutivo atual e sinceramente estar dando o máximo de si. Ninguém pode dissimular o essencial. Causa imediata repulsa o desonesto com ares de santo. Fica óbvio, mesmo que não se possa provar coisa alguma, e a pessoa é vista com suspeita, ainda que faça todo o jogo correto da manipulação dos fatos e das informações.

Amigo, é evidente que não deve ser displicente com sua aparência, expondo-se gratuitamente à maldade e à malícia alheias. Todavia, antes de pretender parecer ético ou honesto, seja. Ninguém engana a Deus, nem a si. E a vida demonstra, cedo ou tarde, que nem aos outros também. Sempre se paga muito caro o preço da mistificação. Na melhor das hipóteses, quem consegue ludibriar bem a multidão, segue atormentado por desconfianças em casa, incapaz de tirar a máscara entre os entes queridos, ou duvidando da inocência e pureza de almas valorosas, ao seu lado, que sinceramente o amam, torturando e torturando-se em terríveis e desgastantes maltratos psicológicos, desperdiçando as maiores oportunidades de ser feliz, espantando quem presta de perto de si, eliminando o bem querer e mesmo a presença de por quem deveria ser eternamente grato, por amá-lo apesar de tudo.

E se você cometeu algum deslize na juventude, ou mesmo hoje, pare de preocupações tolas com reputação. Quem é sincero e bem intencionado em seus atos, é perdoado por seus equívocos, e mesmo mais admirado em suas fraquezas, quando não as tenta ocultar com mentiras. Nem tudo poderá ser reconhecido em público – também é claro: a omissão da verdade, embora não a sua distorção, ainda será uma prática indispensável na Terra ainda hipócrita, má e incoerente de hoje. Entretanto, se você emana boas intenções, boa vontade, desejo de servir e ser útil, de acertar e se melhorar, as pessoas perceberão, e facilmente lhe concederão compreensão, senão mesmo o perdão. Concentre-se, assim, no bem que pode fazer agora – isso é o essencial – porque, como disse o Apóstolo, o amor cobre a multidão dos pecados.

Quem estiver sem pecados atire a primeira pedra, disse Jesus. Você não precisa se consumir em remorsos por ter-se percebido em falta. Se percebe seus erros e tenta se emendar, está no caminho do progresso. O mal está ou em não enxergar os próprios defeitos, ou em notá-los e manter-se omisso em relação a eles. Faça um contínuo esforço por se melhorar, e a energia de seu empenho espiritual por melhorar, o padrão psíquico de sua consciência tranquila por causa desse esforço atrairão a simpatia, o respeito e consideração das pessoas, aconteça o que tenha acontecido. E, quanto àqueles que lhe negarem afeto e aprovação, recorde-se também de que é inevitável que os encontre, seja você quem for, faça tanto bem quanto faça, seja perfeito como possa, em um mundo ainda atrasado como o planeta em que vive. Portanto, abstenha-se de se entregar a qualquer tipo de sentimento de culpa, por notar-lhes os olhares de desdém, aversão, ódio ou escárnio. Você não pode se culpar pela maldade, pela loucura ou pela ignorância dos outros. Siga, tão-somente, em paz, em seu caminho de ideal, e confie exclusivamente (nem mesmo a si) a Deus, o Ser Infinito Amor e Absoluto Perdão, a função de julgá-lo. Concentrado no melhor, em fazer o seu melhor, e se tornar o melhor, o próprio tempo encarregar-se-á de dissolver todas as nuvens sombrias que sente pesarem sobre sua cabeça, convertendo-as, rapidamente, em hosanas de louvor, a encher de júbilo seu coração valoroso e de tranquilidade a sua alma sequiosa de serenidade e de paz.

Eugênia-Aspásia (Espírito)
Bejamin Teixeira de Aguiar (médium)
3 de janeiro de 2001