Benjamin Teixeira
pelo espírito
Eugênia.

O grande dramaturgo britânico William Shakespeare disse, há muito tempo, pela boca de uma de suas personagens mais famosas, Hamlet, mas não foi devidamente considerado até a presente data, em toda extensão de significados de sua máxima famigerada: “Há mais mistérios entre o céu e a terra do que possa imaginar nossa vã filosofia”.

Hoje, sobre esta assertiva célebre, normalmente interpretada como uma alusão metafórica à realidade espiritual e a toda a gama fenomenológica de interação entre a dimensão extra-física e a física de vida, pretendemos dar um foco diferente, tomando uma rota psicológica e filosofal mais profunda de exegese, que aqui nos interessa ventilar rapidamente, para nossa edificação moral.

A espécie humana tem a tendência de supervalorizar sua capacidade de percepção e de avaliação das coisas. A inteligência humana é muito limitada em todos os seus potenciais e atributos. Deslumbram-se os humanos com seu poder de processamento de informações e concepção de idéias recém-adquirido (alguns milhares de anos nada significam ante os milhões e bilhões de evolução biológica que lhes antecederam), e, com isto, desatam-se a incorrer em impropriedades amiúde grotescas do poder de avaliar, abstrair e compreender. Ante esta perspectiva, podemos desembocar, facilmente, na ilação de que o indivíduo cometeria muito menos erros se considerasse esta verdade fundamental: a incapacidade, inerente à humanidade, para enxergar a verdade.

Sem auto-crítica, não pode haver bom senso genuíno, amadurecimento psicológico, muito menos o que se costuma chamar de “iluminação espiritual”: o alcance de níveis transpessoais de consciência – estágios superiores de expressão do psiquismo, em que são transcendidas todas as questões e questiúnculas do ego. Somente por meio do estudo criterioso em torno das múltiplas possibilidades de se cometerem equívocos é que se pode avançar no sentido de errar menos, ao menos nos aspectos e implicações, desdobramentos e conseqüências mais graves dos deslizes inexoráveis à condição humana, que fatalmente ocorrerão, enquanto se pertencer à espécie que é híbrida-transição entre o anjo e o animal.

Por isso, ensinou-nos Jesus que aquele que se humilhasse, seria exaltado, tanto quanto aquele que se exaltasse seria humilhado. Por corolário inevitável à sua própria falha de foco e de escolhas, o arrogante é conduzido a cometer erros maiores e, assim, sofrer os resultados destas suas faltas mais sérias. Ao passo que, de inversa maneira, quem nota sua limitação, não só pode tomar providências práticas no sentido de dirimir ou transpor certas barreiras, como até se colocar como canal de forças e inteligências mais desenvolvidas, como acontece freqüentemente não só com religiosos e cultivadores dos fenômenos de intercâmbio inter-dimensional, mas com profissionais sérios e bem intencionados de todos os campos do saber e da atuação humanos, pelos mecanismos sutis da inspiração, universal dádiva divina ao gênero de que somos partícipes.

Acautelemo-nos de nos sentir portadores da verdade, a fim de que beneficiemos a nós mesmos, primeiramente. Isto pode soar um truísmo batido. Entretanto, muitos dos que aquiescem, conscientemente e em alta voz, com esta afirmação óbvia “de verdade” (por ironia), inconscientemente agem de modo reverso, como bem revelam os generalizados vícios humanos da crítica ao que se desconhece, do desdém ao que não se compreende, do deboche para com coisas sagradas e iniciativas santas.

Reconhecer a própria limitação e falibilidade não constitui um valor moral, mas, sobremaneira, um traço de lucidez intelectual e de saúde mental. Ou seja: orgulho é desconexão com a realidade axiomática de que não vemos ou sabemos tudo. Ao passo que a humildade, em seu primeiro nível de manifestação verdadeira está fulcrada na percepção fidedigna da realidade de sermos muito pobres na leitura da própria realidade, seja intrínseca ou extrínseca a nós mesmos (o que, num nível mais profundo, não importa diferenciar).

Comecemos por reconhecer nossa pequenez e, quiçá, poder-nos-emos candidatar à grandeza de que estamos ainda distantes, e que nos caberia reverenciar, onde está e em quem está, a fim de que, aprendendo com quem pode nos ensinar, por estar à frente, acelerássemos nosso próprio crescimento, em direção à plenitude.

(Texto recebido psicofonicamente em 6 de setembro de 2005.)