Benjamin Teixeira de Aguiar
em diálogo com o Espírito Eugênia-Aspásia
17 de fevereiro de 2007

Benjamin Teixeira de Aguiar – O país se comoveu com a morte trágica de um menino que foi arrastado por vários quilômetros na “Cidade Maravilhosa”, preso ao cinto de segurança e dependurado do lado de fora de um carro levado por assaltantes (1). Teria algo a dizer sobre isso?

Espírito Eugênia-Aspásia – O primeiro item que, embora mais óbvio, devemos destacar, pela sua relevância, é o caráter de alerta de que se revestiu o funesto evento, denunciando o grau de quase caos que se estabelece no estado de direito e paz social, profundamente comprometido em terras brasileiras, sobretudo nas metrópoles, com realce para o Rio de Janeiro. Não deve haver pânico, porém. Noutro tempo, em grandes cidades do exterior e em circunstâncias similares, houve reversão do quadro para níveis mínimos de criminalidade. A vontade política, acionada pela pressão popular, pode perfeitamente solucionar a pendência (2).

O segundo quesito a ser considerado, que julgamos mais importante, reside no fato de as multidões precisarem de um espetáculo de perversidade, para que despertem de seu próprio estado brando de crueldade, a crueldade da indiferença culposa, ante conjunturas desumanas conhecidas, mas que se tornaram corriqueiras, no famigerado fenômeno psicológico da banalização da violência e da tragédia.

Uma linda criança branca de classe média morreu de forma hedionda, numa capital glamorosa do Brasil, e o país é tomado por uma avalanche de sensibilidade. Entretanto, ano sobre ano, década sobre década, em torno de 30 mil(!) crianças morrem, diariamente(!), no mundo – a maioria na África, e metade em decorrência de desnutrição (3)… Quanto se fala sobre isso na mídia (4)? E sobre os milhares de jovens que caem na prostituição, no vício e em regimes de trabalho quase escravo, em diversos pontos do país?… A imprensa, todavia, não mais se interessa em noticiar, porque tais assuntos já se tornaram trivialidades do cotidiano brasileiro.

BTA – Em virtude de tragédias como a desse menino, tendo em vista que havia um menor entre os assaltantes, acelera-se o processo legislativo de redução da maioridade penal para 16 anos, há muito tempo proposta, em nosso país. Gostaria de trazer algum esclarecimento sobre o tema?

EEA – Se a lei pátria faculta a jovens de 16 anos o direito de eleger seus governantes, por que não podem ser eles responsáveis por crimes que perpetrem? Participar da condução dos destinos da nação seria menos complexo ou significativo do que responder pelos próprios atos? Há uma crassa incoerência: dá-se-lhes o direito de votar aos 16 anos, mas não se lhes impõe o dever da responsabilidade por um acidente de trânsito que provoquem, dirigindo sem habilitação, por exemplo.

Decerto, adolescentes dessa idade são muito inexperientes. Diríamos mesmo que alguém na casa dos vinte ainda o é. Só bem depois dos 30 anos é que se “assentam” completamente os circuitos cerebrais, como revelam recentes pesquisas de Neurociências do plano físico. E a correspondência com o que se passa no campo da maturidade psicológica é perceptível: indivíduos só se tornam de fato adultos quando estão próximos de completar 40 janeiros de vida (5).

Entrementes, aos 16 anos – e até antes: aos 14 –, o ser humano sabe muito bem, na atualidade, com tanto bombardeio de informações pela mídia, se está cometendo um ato criminoso ou não, e deve, pois, responsabilizar-se por suas infrações. Nessa fase do desenvolvimento neurofisiológico, o arcabouço mínimo da estrutura cerebral já está montado, e o espírito reencarnado, portanto, é senhor de seus atos (6).

(1) Veja artigo da Wikipédia “Caso João Hélio 
(Nota da Equipe SQ)

(2) Em 1977, a cidade de Nova York havia chegado a índices alarmantes de criminalidade, e uma política severa de “tolerância zero” aboliu o estado de quase pandemônio que se instalara na “capital do mundo”.
(Nota do Médium)

(3) Segundo pesquisas mais recentes, 16 mil crianças morrem, diariamente, no mundo: a maioria na África, e metade por fome.
(Nota da Equipe SQ)

(4) A Autora espiritual faz questão de qualificar “criança linda, branca, de classe média”, para gerar um contraste especialmente com a realidade das crianças “africanas”, mortas aos milhares. Chama-nos a atenção para o preconceito de múltipla expressão, sintetizando-o com esta pergunta implícita: teria menos valor a morte de uma pessoa pobre, feia e/ou negra, a ponto de ser ignorada pela mídia?
(Nota do Médium)

(5) Obviamente, há exceções. O ascendente do espírito é soberano no tocante a “maturidade-lucidez”, de modo que pessoas de tenra idade podem demonstrar clara sabedoria, enquanto outras permanecem broncas, não importando quanto o veículo de carne envelheça – amiúde piorando sua capacidade de percepção e avaliação com a decadência neurológica da senectude. No entanto, o corpo material, com suas propriedades e funções na sinergia organismo-psique, no transcurso da reencarnação, tem seu poder de influência sobre a manifestação do espírito que o anima. Eis por que criaturas que apresentam grande maturidade na juventude acentuam-na na meia-idade e na velhice. Quando ocorrem casos que pareçam contrariar esse princípio, uma simples análise demonstrará que, no fundo, nunca houve maturidade na juventude, e sim uma máscara de pseudoadultidade, que ocultava um caráter imaturo, desejoso de afluir à tona da consciência e desdobrar-se em comportamento, mas que jazia impossibilitado para tanto, castrado por uma educação exacerbadamente formal e conservadora, ou mesmo por pruridos de pretensão de superioridade, por exemplo.
(Nota da Autora espiritual)

(6) Interessante notar que Chico Xavier partilhava de opinião idêntica, já dizendo, nos idos de 1984, que a televisão tornara precoce a adultidade e que, dessarte, jovens de 14 anos poderiam ser, sim, responsabilizados por suas ações criminosas. Lembremos que nosso país, com legislação vanguardista também nesse particular, foi palco de um precedente curiosíssimo: o Imperador D. Pedro II assumiu o trono, com formal endosso da sociedade brasileira, no longínquo ano de 1840, antes de completar 15 anos – portanto, à altura dos tais 14 anos de idade.
Vale também corroborar outro dado trazido pela Autora espiritual, nesta mesma resposta. O cérebro humano somente para de amadurecer entre os 36 e 38 anos. Regiões como o hipocampo, fundamental para a configuração da memória, desenvolvem-se até essa faixa etária, e continuam a reproduzir neurônios para bem além dela. Por outro lado, embora, por volta dos 16 anos, o cérebro tenha atingido seu tamanho máximo, as ligações sinápticas (entre neurônios), consideradas de capital relevância para o fenômeno da inteligência, continuam a se constituir larga e intensamente depois disso, sobremaneira entre os 20 e os 40 anos de idade, mas, como ocorre aos neurônios, seguem sendo construídas, vida afora.
(Nota do Médium)