(A psicografia pública de um ente querido desencarnado, para um jovem freqüentador de nossas palestras.)

por Benjamin Teixeira.

Com voz doce e pausada, como lhe é típico, após um dos meus Cultos Diários do Evangelho, Gustavo Henrique, muito paternal, pediu-me que relatasse, por escrito, o episódio que se segue, de modo sucinto, como de fato o penso ter feito.

1992. Era mais um dia difícil (sempre terça-feira), em que teria que conduzir um grupo de estudos para três ou quatro pessoas (com sorte, oito a dez)… na altura de meus 22 anos recém-completados.

– Creio que deva desistir… – pensei comigo.

Desci do coletivo, arrastando-me como um condenado revel, da mesma forma como subira nele. Parecia estar lutando contra tudo e contra todos. Não havia apoio de familiares, nem de irmãos de ideal espírita, nem de colegas ou professores da universidade. Eu estava priorizando o que todos alcunhavam de “fanatismo” ou de “desvio de rota”, “irresponsabilidade” ou “idealismo ingênuo”, com poucas mudanças de palavras, quando não se incluíam acusações mais sérias.

– Não creio que vá desistir propriamente do ideal de divulgar a imortalidade da alma, à minha maneira, o Espiritismo como o entendo, mas julgo apropriado parar de psicografar ao fim das reuniões de estudos, como venho fazendo até então. Não tenho estofo moral nem aptidão mediúnica bastante para uma responsabilidade deste quilate e envergadura.

Comecei a reunião às 20h15, pontualmente (havia uma aula na escola de Ballet de minha mãe, que se encerrava às 20h, e eu aproveitava a sala livre para ministrar as “preleções espíritas”): as pessoas fizeram perguntas sobre os itens fenomenológicos da mediunidade, e, ao término do debate brando de uma hora, apus-me concentrado para fazer a psicografia pública.

Uma carta, duas, três, para os presentes poucos que se aglomeravam em semicírculo, em torno de mim. Orientações, conselhos, pedidos de oração e equilíbrio, moderação e fé, por parte de mestres da Espiritualidade Sublime, que preferiam manter-se incógnitos, a não ser a própria Eugênia, que, já naquele tempo, aqui ou ali, assinava algumas das epístolas fraternas e despretensiosas. A certa altura, porém, senti-me rodopiar (o perispírito deslocou-se um pouco mais do corpo físico), o coração acelerou, a respiração ficou ofegante, a mão direita acelerou seu movimento, visivelmente, na comunicação manuscrita da outra dimensão de Vida, em velocíssima atividade de psicografia semimecânica, vencendo folhas em branco, preenchendo-as com palavras de estímulo e conforto, com enorme “facilidade”. Progressivamente, sentia menos o braço, que “adquiria vida própria”. Era uma mensagem afetuosa, para um rapaz presente, e a entidade, um senhor muito paternal, assinou, protestando saudade, com um “Humberto”.

Quando terminei a escrita psíquica, estava exaurido. As mãos trêmulas, o braço direito doído, a cabeça “mareada”, como acontecia freqüentemente, naqueles primeiros dias de tarefas mediúnicas públicas.

Li cada uma das missivas, recebidas pelo correio intermundos que abrira recentemente, e, ao chegar àquela que me deixara tão “tomado”, proferi, cauteloso, o nome que subscrevia o texto, preocupado com que não houvesse filtrado apropriadamente o comunicado do Além. Voltando meus olhos para o destinatário, um pouco tenso, porque fizera a leitura diante dos demais, sentindo-me na iminência de uma exposição ao ridículo, das muitas a que me via ultimamente, sendo achincalhado por tanta gente “madura” ou, como melhor seria dizer, “mais velha”, tanto quanto por iniciativa de meus coetâneos, que me viam, francamente, como um lunático inconseqüente, indaguei:

– Desculpe, se filtrei mal a comunicação do Bom Espírito que lhe escreveu, Carlinhos. Mas você conhece algum Humberto, que já esteja desencarnado, e que houvesse tido algum laço estreito de afeto com você?

O jovem – de tez queimada como um indiano – tinha os olhos arregalados e a boca semi-aberta, músculos do rosto arriados, numa elegante versão masculina do “estado de choque”. Balançou suavemente a cabeça, em tom afirmativo, respondendo, quase num sussurro, laconicamente:

– Meu avô…

Ontem, 4 de fevereiro, a reunião com palestras públicas e atividade mediúnica ao fim, que realizo desde 1992, completou 17 anos de existência. Hoje, a ponte psíquica que abro com a outra dimensão de Vida acontece por meio de incorporação plena, a pedido d’Eles mesmos, os bondosos e sábios Orientadores desencarnados.

Neste domingo, em certa medida, estaremos celebrando estes 17 anos, com, agora, magníficas manifestações públicas de Eugênia, o Espírito sábio e santo que capitaneia a grande nau do Educandário Salto Quântico. Seja bem-vindo(a).

 

Irmão em Cristo,
Benjamin Teixeira.
Aracaju, 5 de fevereiro de 2009.


(Revisão de Delano Mothé.)