por Delano Mothé

Semeemos o Bem, pelas iniciativas lançadas no solo da vida, persistente, incansável, continuamente, entregando ao tempo e ao Divino Cultivador o milagre da germinação. Sem o trabalho constante de semeadura, jamais nos será possível a glória da florescência e da frutificação, por dentro e em torno de nossas almas.

Revolvamos a terra árida do próprio coração, abrindo-lhe sulcos e tornando-a dócil às boas obras, receptiva ao novo, à vida. O chão batido, enrijecido, ressequido, é estéril, impermeável que se faz a tudo que nele poderia prosperar, fadado à completa desertificação, à morte. O arejamento e permeabilização do terreno é que lhe possibilitam receber em seu ventre os elementos seminais do porvir verdejante de flores e frutos.

Saneemos nosso canteiro interior, livrando-o dos dejetos que precisam ser expelidos, porque não mais nos servem: aqueles que já perderam sua utilidade na busca de ideais mais apropriados às nossas necessidades atuais e, por isso, contaminam o ambiente mental, dificultando o medrar dos brotos e botões de nova paisagem existencial. No tempo oportuno, conforme lição de Nosso Senhor Jesus, é imprescindível ceifar o joio, a fim de que este não se sobreponha ao trigo, sufocando-lhe o crescimento e matando-lhe a função de alimentar a vida.

Fertilizemos a gleba de nossos impulsos benfazejos, com o adubo dos materiais putrefactos ou em decomposição encontradiços nos recônditos de nós próprios: as misérias, vícios e fixações psicoemocionais que costumam ser rejeitados, mas nos quais justamente jaz a riqueza dos nutrientes à transformação e renovação da lavoura. O que nos parece desprezível, repugnante ou inaceitável, no campo da própria alma, anuncia-nos, em verdade, como mensageiro de nossa sina à completude, a bendita fertilização da leira, por meio do húmus mesmo das defecções interiores mais deploráveis, que nos fermentam e fomentam os processos evolutivos, propiciando-nos a descoberta de cenários íntimos progressivamente mais vicejantes, luminescentes.

Por fim, irriguemos nossas plântulas de bem-aventurança, com o líquido sagrado do próprio suor e lágrimas, no esforço incessante de zelar por cada fase da maturação do botão de Anjo que anseia desabrochar pujante, do imo de nós mesmos, para que a flor da autoiluminação resplandeça gloriosa, refletindo a Luz dos Desígnios Celestiais.

No cerne de tudo, o Amor do Criador-Criadora, promovendo desenvolvimento e complexificação, plenitude e transcendência, “ad eternum”… A menor porção de terra, a mísera gota de chuva, a insignificante partícula de luz, a infinitesimal molécula de oxigênio, cada elemento da Criação traz em suas entranhas a Vida, em possibilidades infinitas de manifestação superior. Confiemos, pois, à Suprema Providência, que está no princípio e fim de todas as coisas, o espocar (a partir da sementeira de nosso trabalho devotado e perseverante no Bem) de exuberante jardim existencial – nosso contributo pessoal ao magnífico Mosaico do Divino Jardineiro, composto de personalíssimos canteiros, num espetáculo imponderável de sabores e cores, perfume e beleza, utilidade e felicidade.

(Texto redigido em março/abril de 2010.)